Isaque abençoa Jacó por Bartolomé Esteban Murillo |
Tanto no Judaísmo quanto no Cristianismo não podemos dizer
com convicção que a fé é fé e assunto encerrado. Existem formas de se
posicionar, de agir e de pensar que são bastante distintas, proporcionando a
sensação que estamos diante de divisões tão herméticas que beiram a
incompatibilidade entre ambas. Quero chamar a atenção par dois paradigmas da fé
tão presentes hoje quanto no período
bíblico.
O primeiro e mais antigo deles é aquele que poderíamos
chamar de “fé por causa de”. O tipo de fé de Jacó: Se Deus for comigo, e me guardar nesta jornada que empreendo, e me der
pão para comer e roupa que me vista, de maneira que eu volte em paz para a casa
de meu pai, então, o Senhor será o meu Deus. Esse é um passo para trás em
relação ao sacrifício realizado pelos pagãos, pois estes ofertavam antes e
ficavam dependentes da boa vontade dos deuses. Mas Jacó impõe condições,
determina e ordena. Se fizermos uma abordagem honesta da “fé por causa de”
fatalmente iremos concluir que esta nada mais é do que a instituição declarada
e definitiva da doutrina da retribuição, do toma lá dá cá, se Deus fizer eu
também faço.
O voto de compromisso de Jacó não é um contexto isolado e
único na Bíblia. Teríamos outros exemplos a dar, tanto no Primeiro como no
Segundo Testamentos, como a oração de Jabez em I Crônicas 4.10 e a dúvida de Tomé em João 20.27. Não quero aqui fazer uma crítica ferrenha a este tipo de
fé, tendo em vista a situação de desespero em que se encontrava Jacó. Quem é o
pai ou a mãe que não ofereceu a própria vida em troca da vida de um filho em
risco de morte? Certas situações nos levam a atitudes que a nossa própria razão
desaprovaria.
Tenho a plena convicção de que Deus não rejeita de antemão este
tipo de fé, pelo contrário. Não sabemos se Jacó cumpriu com a sua parte no
trato, muito menos a quem ele entregou os dízimos. Mas sabemos que ele chegou
com segurança à casa de Labão e que não lhe faltou alimento nem
vestes. Sabemos também que retornou à casa de seu pai, obteve o perdão de
Esaú e tomou posse das promessas. Podemos constatar que neste mesmo sentido, Jesus acolheu a dúvida de Tomé
sem recriminá-la: Põe aqui o dedo e vê as minhas mãos; chega também a mão e põe-na no meu
lado; não sejas incrédulo, mas crente. Porém, escondido nas entrelinhas do
texto, encontramos uma verdadeira, a declaração de fé que Deus realmente espera de nós: Bem aventurados os que não viram e creram.
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