Kobane, a cidade de Aylan na Síria. |
Mais uma vez o mundo fica estarrecido com uma simples foto das inúmeras que foram tiradas de mais uma chocante tragédia que assola a nossa geração. A imagem do menino sírio Aylan morto com o rosto na areia é algo que deixa consternado até mesmo o mais empedernido coração. Não deve haver uma pessoa sequer que não estivesse diretamente envolvida neste ou em semelhantes conflito que não tenha se sentido a pior das criaturas.
Por mais distante que estivéssemos regionalmente daquela situação, a cena de uma criança branca e bem vestida se incumbiu de trazer a tragédia para dentro de nossas casas, e não existe possibilidade alguma de não termos esboçado uma reação de indignação e repugnância profundas. Vários foram as pessoas e organizações que manifestaram publicamente o mais exato realismo dos seus sentimentos. Algumas destas manifestações nos trouxeram à memória alguns outros flagrantes de crianças vitimadas por tragédias semelhantes. A do menino africano assediado por um urubu, a da menina vietnamita correndo de um bombardeio e de outras crianças mortas por bombas, tiros e afogamentos. Mas uma me chamou especial atenção, a referência ao fato dada pela ATEA – Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos, que, como legenda da foto do Aylan, dizia: Se Deus existisse, seria um canalha.
É mais que justo a pessoa manifestar a sua opinião, e a expressão dos sentimentos é muito bem-vinda, pois elas revelam a parcela de culpa que cada um de nós sente diante de um infortúnio de tamanhas proporções. Mas o que temos aqui é uma evidente manifestação de culpa que sendo transformada em uma caça às bruxas que supostamente seriam as causadoras da tragédia. Notem que a ATEA não está se referindo à existência de qualquer deus. Não está em questão aqui a existência do Deus muçulmano, religião predominante naquele país, nem os deuses de povos vizinhos, tais como os deuses do hinduísmo ou das ostras culturas árabes. O alvo dos ateus e agnósticos desta associação é diretamente o Deus dos cristãos. Diria o meu amigo super-ateu, a quem me referi em uma postagem anterior, que isso é uma estratégia ignorante, pois em uma circunstância em que a existência de Deus é contestada, a sua onipresença não pode sequer pode ser cogitada. Eu queria que a ATEA me explicassem, dentro do seu conceito de divindade, como é que o deus que não existe aqui pôde ter ingerência no conflito em um país que venera outro deus, que, segundo eles, também não existe?
Jesus nos diz que se nós, ainda que distantes, se estamos pensando que somos melhores pessoas, e por isso menos culpados dos que os agentes causadores das tragédias estamos redondamente enganados. Se caminharmos mais um pouco neste texto, nos depararemos com a parábola da figueira estéril, em que Jesus diz claramente que o momento é de transformamos toda a nossa indignação em solidariedade. Ele nos chama da culpa para a responsabilidade. Não somos diretamente culpados, mas somos todos, judeus, cristãos, muçulmanos e agnósticos intransferivelmente responsáveis.
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