Sonhos concretos

Os montes trarão paz ao povo, também as colinas a trarão, com justiça. Julgue ele os aflitos do povo, salve os filhos dos necessitados e esmague ao opressor. Ele permanecerá enquanto existir o sol e enquanto durar a lua, através das gerações. Seja ele como chuva que desce sobre a campina ceifada, como aguaceiros que regam a terra. Floresça em seus dias o justo, e haja abundância de paz até que cesse de haver lua. Salmos 72.3-7
Elevo os meus olhos para os montes, eyesontheeparrow
Não faz muito tempo que eu comentei, através desse blog, uma postagem de uma pessoa que me é muito cara, que no Facebook dizia que a Bíblia só serve para calçar pé de mesa. Lembro-me de ter dito que qualquer livro serve para esta finalidade. Então, a Bíblia como livro não estaria isenta de se prestar para este necessário fim. Porém, faço agora uma ressalva: somente se a mantivermos fechada, porque quando aberta ela é perigosamente transformadora.

O Salmo 72, texto sugerido para hoje pelo Calendário Litúrgico da Igreja Católica, pode nos mostrar uma nada sutil diferença que existe entre este dois estados de como podemos ver a Bíblia: fechada e aberta. Fechada, esteja ela na estante, debaixo do braço ou calçando o pé da mesa, não vai se diferenciar de qualquer outro tipo de literatura. Mas se aberta podemos nos deparar com textos como esse, que embora escritos há quase três mil anos, são de uma atualidade avassaladora.

Vejamos a percepção que salmista nos revela ter sobre a esperança de um mundo de paz, no seu breve ensaio sobre a justiça. Nós que tanto vivenciamos, quanto testemunhamos, há alguns dias, as mais diversificadas manifestações de esperança num ano novo melhor, vamos perceber que nada do que vimos se assemelha a realidade que o poeta da Bíblia deixou registrado.

Em primeiro lugar, ele espera que a paz desça dos montes, que eram, nas cidades da antiguidade, onde moravam as pessoas de maior poder financeiro e de influência. Porém, ele não acredita nas pessoas, e sim na  justiça. Uma justiça que não está num lugar distante, seja ele um Xangrilá ou faz parte de uma visão de um dois sonhos das Mil e uma Noites. Está num lugar real e pode ser alcançada, basta que haja um julgamento justo que salve o povo aflito e esmague o opressor. Quem é nesse mundo de Deus que não sabe disso? Mas também quem é que teve a coragem de celebrar a passagem de ano desta forma?

Em segundo lugar, ele entende que deve ser algo que lave completamente a alma, e que não traga a ressaca de um dia seguinte. Mas que seja duradouro, e não apenas uma breve celebração de uma noite, na quase que certeza de que a crueza da realidade haverá de prevalecer e nos assaltar ao romper do dia.

Em terceiro lugar, ele não coloca sua esperança em nada do que já existe ou existiu, como em Algum lugar do Passado, ou em uma ideia revolucionária que se apresente como solução redentora, mas sim no florescer de uma nova ordem, diferente de tudo que se conheceu até então.

Em quarto lugar, para ele os astros, que para muito são os elementos que fazem as coisas acontecerem, e que é onde depositam a sua esperança definitiva, servem apenas como sinalizadores do tempo. De um tempo que começa agora, e ainda que mal formado, poderá durar enquanto a luz da lua brilhar sobre as nossas cabeças.

Meu caríssimo sobrinho, a você que hoje vive a gloriosa expectativa da paternidade, eu recomendo que calce bem a sua mesa e tome cuidado, pois muito poucas coisas nessa vida podem fazer diferença quando olhadas de perspectivas diferentes. A Bíblia é uma delas. 

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