Jesus e o mundo, Chretiens 2000 |
As variadas especulações sobre o que Jesus quis dizer com
"moradas da casa do meu Pai" têm servido para fundamentar uma
quantidade enorme de doutrinas, não somente na fé cristã, como também em outros
credos. As mais divulgadas são aquelas que fazem referência a outros planetas
habitados por vida inteligente e a que fala especificamente da reencarnação.
Porém, o cristão deve atentar principalmente para o momento
histórico da vida de Jesus para tirar as suas conclusões do texto. Qualquer judeu que tivesse ouvido Jesus falar da casa do meu Pai, se lembraria imediatamente do texto de Isaías 56, referindo-se ao Templo de Jerusalém. Nenhum daqueles ali presentes pensaria em uma vida após a morte. Porém, o contexto se dá em um clima de apreensão e
incerteza, pois trata-se do que os teólogos chamam de "discurso de despedida".
Então, logo de saída podemos perceber que deveriam ser palavras de conforto e
esperança para quem estava vivendo toda a tensão dos últimos momentos do
ministério terreno de Jesus.
Não podemos, de igual modo, afirmar que é um texto
escatológico e que se refere à futura segunda vinda de Jesus, porque tamanha
apreensão não poderia jamais aguardar os mínimos dois mil anos que separam as
palavras da concretização da promessa. O problema era urgente e merecia uma
solução urgente. Os discípulos estavam assustados, pois não faziam a menor
ideia de como prosseguiriam na caminhada da fé, uma vez que o mestre que os
guiara até ali estava dando sinais claros de que iria deixá-los por um tempo
indefinido. E é justamente aqui que temos que nos lembrar das promessas que
Jesus fez de não nos deixar órfãos um instante sequer.
Diante do paradoxo de uma ida sem volta definida, e da total
negação da possibilidade de abandono, temos que entender que a conversa tinha o
objetivo de definir bem mais do que o lugar exato de onde seria a habitação de
Deus. O assunto deveria necessariamente abordar o que os fiéis às promessas
poderiam esperar, com absoluta convicção, que as portas da casa de Deus
estariam sempre escancaradas para eles.
Deus é gordo,
definiu Jorge Amado em seu poema Dona Flor e seus dois maridos. E eu penso que
é este o caminho mais seguro para se trilhar quando nos deparamos com um texto
desta complexidade: apelar para o amor incomensurável de Deus e o bom humor
sempre presente em Jesus. Geralmente é uma pessoa gorda que promove as festas e
que está constantemente sugerindo algo agradável para se fazer. Por maior
apreensão que estejamos vivendo, as alegrias da casa do Pai são maiores ainda.
Então, entender que Jesus estava dizendo que na casa do seu
Pai cabe todo mundo, não é nenhuma heresia ou absurdo teológico. Seria uma contrapartida ao Templo de Jerusalém onde era permitida apenas a entrada de uns poucos. É sim tentar
dar às palavras uma conotação mais próxima do que seria o mais aconchegante de
todos os confortos: o conforto maternal. Eu até ousaria ir mais longe. Diante
de tantos empecilhos e regras de conduta moral criados pela igreja nesses dois
mil anos de espera, eu penso que Jesus estava querendo mesmo dizer as palavras
exatas que eu li há algum tempo, no Chiador, num quadro na parede da casa dos
amigos Helô e Zezé: Na casa da vovó pode
tudo.
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