Elias já veio

Decapitação de S. João Batista, Massimo Stanzione
Mas os discípulos o interrogaram: Por que dizem, pois, os escribas ser necessário que Elias venha primeiro? Então, Jesus respondeu: De fato, Elias virá e restaurará todas as coisas. Eu, porém, vos declaro que Elias já veio, e não o reconheceram; antes, fizeram com ele tudo quanto quiseram. Assim também o Filho do Homem há de padecer nas mãos deles. Mateus 17.10-12

Como ficou interessante o fato deste episódio da vida de Jesus ter sido colocado na Bíblia imediatamente após a transfiguração no monte onde Elias e Moisés apareceram para o espanto aterrorizado de Pedro, Tiago e João. Justamente na hora em que uma das promessas da vinda do Messias havia acabado de ser cumprida. Isso impressionou tantos os discípulos que por um bom tempo entre eles não se falou em outra coisa. Basta ver que não pararam de comentá-lo, assim como também não pararam de assediar Jesus fazendo repetidas perguntas sobre esse assunto. É o versículo que inicia o nosso texto base de hoje: Mas os discípulos o interrogaram: Por que dizem, pois, os escribas ser necessário que Elias venha primeiro?

A expectativa da vinda do Messias crescia muito em períodos de opressão e nessa hora não faltavam aqueles que vasculhavam os acontecimentos em busca dos sinais que, segundo um texto deuterocanônico bem conhecido na época de Jesus, anunciava que esta vinda estava próxima: Eclesiástico 48.9 – Tu que foste arrebatado num turbilhão de fogo, num carro puxado por cavalos ardentes. Tu que foste escolhido pelos decretos dos tempos para amenizar a cólera do Senhor, reconciliar os corações dos pais com os filhos, e restabelecer as tribos de Jacó. Parece ser esse o texto que Jesus menciona quando afirma: De fato, Elias virá e restaurará todas as coisas. Mas o que deveria ser motivo de esperança para todo o povo consolidava-se em mais uma ameaça de punição devido às suas iniquidades: Mas eu vos digo que Elias já veio, e eles não o reconheceram, mas fizeram com ele tudo o que quiseram.

Pela primeira vez os mestres da lei estavam absolutamente certos. Elias precisava realmente comparecer perante o Messias. Logicamente que não seria o Elias real do Primeiro Testamento, mas aquele que representaria tudo aquilo Elias representou no sentido profético. Assim como Elias foi considerado um dos maiores profetas do Primeiro Testamento, João Batista é reconhecido por Jesus como o maior profeta entre todos: Mateus 11.11 – Em verdade vos digo: entre os nascidos de mulher, ninguém apareceu maior do que João Batista; mas o menor no reino dos céus é maior do que ele.

O anjo que apareceu a Zacarias, pai de João Batista, já havia lançado uma luz sobre isso: Lucas 1.16-17 – E converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor, seu Deus. E irá adiante do Senhor no espírito e poder de Elias, para converter o coração dos pais aos filhos, converter os desobedientes à prudência dos justos e habilitar para o Senhor um povo preparado. 
Aqui não era mais um escritor obscuro da antiguidade que estava falando, mas é o próprio Deus quem está se referindo a João Batista como sendo o novo Elias. Por isso precisamos verificar detalhadamente o que esse Elias do Segundo Testamento tem a nos dizer.

Ele irá adiante do Senhor, no espírito e poder de Elias. Uma coisa não faltou a João Batista: a ousadia de atrair para si a atenção de multidões para anunciar-lhes o Reino absoluto de Deus. Uma atitude de alta periculosidade, pois era considerada subversiva e seria punida severamente pelas leis romanas.

Para converter o coração dos pais aos filhos, converter os desobedientes à prudência dos justos. João Batista se colocou como o divisor de águas da lei antiga. A partir dele Israel nunca mais deveria ser um povo voltado para o rigor do legalismo, mas um povo com o coração voltado para Deus. Tal como Elias no Monte Carmelo, João Batista trouxe o coração do povo de volta para Deus.

Habilitar para o Senhor um povo preparado. Aqui não importou o preço a ser pago. Assim como foi, na realidade, rejeitada a pregação de João Batista, da mesma forma a pregação de Jesus foi desprezada pela multidão. Assim como Elias viveu sob ameaças constantes de uma rainha iníqua em seu ministério, João Batista também foi sacrificado em nome da iniquidade de uma rainha que não podia resistir à sua rigidez de caráter.

Elias já veio e completou o seu ministério. Tentou de todas as maneiras, mesmo as menos convencionais, incutir na sua geração a necessidade imediata de uma renovação completa de mente e de atitude. Através de exemplos simples nos deixou os elementos primários de um povo habilitado ao Reino de Deus: Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento. Não comeceis a dizer entre vós mesmos: Temos por pai a Abraão; porque eu vos afirmo que destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão. Quem tiver duas túnicas, reparta com quem não tem; e quem tiver comida, faça o mesmo. Não cobreis mais do que o estipulado. A ninguém maltrateis, não deis denúncia falsa e contentai-vos com o vosso soldo.

Se não estamos preparados ainda para suportar a mensagem preliminar do Reino de Deus, e ainda estamos completamente alheios às sua exigências primárias, como receberemos aquele a quem João Batista veio anunciar?

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