Dois males, o melhor

Cartaz da Ópera Rigoletto de Verdi (1813-1901)
Recentemente fui chamado de idiota pelo rev. Silas Malafaia somente porque não pregava a doutrina da prosperidade. Isso se torna uma coisa desagradável porque o meu delito não é apenas não pregar esta doutrina, mas por pregar abertamente contra ela. No entanto, a minha condenação não para aí. Este não é nem de longe o meu único delito, uma vez que não é esta a única doutrina neopentecostal que já me manifestei contrário. Já manifestei publicamente o meu repúdio a varias outras doutrinas, tais como: da retribuição, da causa e efeito, da maldição hereditária, da guerra espiritual, do toma-lá-dá-cá, é dando que se recebe, uma vez na graça sempre na graça, predestinação absoluta, e, com certeza de outras tantas devo ter me esquecido, e das que ataquei sem mesmo saber que nesta segmento da igreja coexistem.

Mas a isso considerei esterco, palavra que reza nas atuais traduções como das mais chulas, porém palavras apropriadas ditas pelo velho apóstolo no passado. Este não é o primeiro e com certeza não será o único delírio do maior gritador que o evangelho já teve em todos os tempos. Não estou tratando de falar de pregadores, já conheci homens e mulheres infinitamente melhores. A minha indignação quanto a isso já esmoreceu, por isso prefiro não tentar antecipar o tipo de retribuição que em muito breve fará jus este senhor. 

Quero falar do quanto estou indignado com um sermão que me chama abertamente de otário, cuja gravação pode ser assistida neste link http://www.youtube.com/watch?v=OFciEdpCKPE.  Além das incongruências teológicas destaco as seguintes frases: O princípio protestante” é orgulhoso. ... e se Deus quiser que você use os outros (como mediadores), o que você vai fazer, otário. (sic)
Tenho que dizer de antemão que faço parte de um organismo ecumênico sério, onde a oportunidade de manter relacionamentos sinceros e produtivos com padres e bispos da Igreja Católica Romana. Nada do que digo aqui se dirige direta ou indiretamente a esta igreja irmã, a quem devo tão somente profundo respeito, como também grande admiração. Devo dizer que nada tenho contra o padre Azevedo Júnior, uma vez que o ouvi apenas por breves e infelizes 6 minutos e 52 segundos.

Como argumento básico da sua pregação admoestando a “religião protestante” (prometo falar dessa idiotice um dia), o tal padre usou I Timóteo 2,5 que diz: Só há um mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem. Na sua beligerante pregação o padre afirmou categoricamente que o Jesus citado por Paulo é o cabeça de um grande corpo, do qual eu, você, Maria, o Papa e todos os santos fazem parte. Ele disse que o único mediador é Cristo, mas “Cristo Total”, e não somente a cabeça, concluindo desta forma que o único mediador vem a ser cabeça, tronco e membros. Não quero crer que há aqui uma velada intenção de se criar uma nova Trindade, mas, se o padre não conseguiu desta vez, está perto de fazê-lo.

Não faço a mínima ideia de onde o rev. Azevedo desencavou a sua pérola, porque comentários acessíveis a leigos, facilmente encontrados nas duas versões mais consistentes da Bíblia editadas pela sua própria igreja, se mostraram radicalmente opostas a essa, que espero ser exclusivamente sua doutrina. A Bíblia de Jerusalém assim comenta o versículo: Jesus é mediador em sua qualidade de homem, que lhe permite ser salvador de todos, com sua morte em resgate por eles. Já a Bíblia do Peregrino é muito mais enfática: O mediador único entre Deus e os homens é um homem chamado Jesus, cujo título é Messias; com ele ficam abolidas as mediações de outras religiões e cultos.

Prometi não falar agora sobre religiões e nem preciso, porque o comentário fala especificamente que ficam abolidas as mediações de outros cultos, e ela não podia ser mais clara. O simples fato de creditar-se o mistério da mediação a Jesus, mérito que foi obtido durante o seu ministério terreno, ainda na sua condição humana, tira por completo a possibilidade de aludirmos o feito a um “Cristo Total”, como diz o padre, ou ao Cristo glorificado, como prefiro chamá-lo. Se fôssemos remidos por Jesus na sua condição divina, de nada valeria e seria vazia a nossa pregação e vazia a vossa fé, como também disse Paulo. Se Cristo não morreu, se Deus não morreu, não há mediador que dê jeito. Estamos irremediavelmente perdidos, e como o Cristo do padre, totalmente enganados.

Mas ele disse também que o protestante nutre um incontido ódio pela igreja, e que não aceita a intermediação dela, porque é soberbo e orgulhoso. Será que estou percebendo aqui a intenção de proclamar a Igreja Católica Romana como única? Será que o padre ainda prega que qualquer manifestação contrária a sua igreja é uma infração cometida diretamente contra Deus? Não vou perguntar de que século ele é, pois bem sei que os antigos inquisidores não gozaram do privilégio de serem gravados ao vivo. Somente os atuais tem a bênção da internet. Mas ainda prefiro acreditar que ele não pensa assim. Se preciso for, dou uma de otário.

Eu queria encerrar com a máxima que causou delírio na congregação eufórica: O protestante acha que não precisa de ninguém. O protestante diz: eu vou direto pra Deus. Eu não preciso de Maria, eu não preciso de padre, eu não preciso do Papa, eu não preciso da igreja, eu não preciso doa sacramentos, eu não preciso de ninguém. Puxa tu é o cara.

Eu sou mesmo o cara. O cara que o padre chamou de otário. O cara que o Malafaia chamou de idiota. O cara que está com crise de identidade por não se definir como pregador.  Ainda não sei se sou mais idiota do que otário, ou se é o contrário. Sou idiota porque creio que Cristo morreu uma única vez pelos pecados dos justos e dos injustos, que Deus faz brilhar o sol e envia chuva igualmente sobre ambos. Sou otário porque dou à Virgem de Belém o valor justo, o da mulher mais grandemente usada por Deus. Talvez seja otário por admirar as obras do rev. Ratzinger, como um dos maiores teólogos vivos, ou de valorizar os santos como exemplos de fé a serem seguidos. Admiro a sua igreja como o maior ramo da, essa sim Religião Cristã, e sou consciente dos problemas que isso acarreta. Sou mais otário ainda quando beijo a mão de qualquer pessoa, independentemente de ordenação, porque nelas tento ver o rosto do Cristo. O que pode me salvar é alguma coisa do que disse o velho pastor Spurgeon, que era idiota e otário como eu. E ele disse: entre dois males (ser idiota ou otário), não escolha nenhum. É o que eu vou fazer.

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