O chamado de Mateus por Hendrick ter Brugghen
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A palavra misericórdia, em hebraico é hesed, possui aspectos de devoção e
solidariedade, mas tem um ingrediente a mais. Ela não é apenas um eco de
bondade que pode se enganar quanto ao seu objetivo, coisa do tipo: vou ser bom, para
Deus ser bom comigo. É uma bondade consciente e uma resposta de fidelidade.
Pois é assim que Deus age conosco, por isso ele exige de nós essa atitude, que
juntamente com a ajuda e a providência, entreguemos também o coração ao
necessitado.
Aí então nós vamos descobrir que há dois tipos de
misericórdia: a misericórdia de Deus, e a nossa misericórdia. São
essencialmente diferentes e incomparáveis, porque as misericórdias de Deus são
o motivo da nossa existência e da nossa subsistência. Contudo, as outras
pessoas não deixam de existir pela falta da nossa misericórdia. Com ela,
poderiam viver bem melhor, mas nós não somos tão essenciais para os outros como
Deus é para nós. Mas existe um segundo aspecto na misericórdia. É o desafio de
Deus apresentado pelo profeta Oséias: Misericórdia
quero e não sacrifício. É bom nos lembrarmos de que a palavra sacrifício
não tem necessariamente a conotação ruim que a damos. Sacrifício é abrir mão do
que nos é caro, é fazer renúncias em favor de alguém ou de alguma causa. Mas
não é só isso, é tornar este ato sacro, separado de qualquer jogo de
interesses. Paulo em I Co 13 diz: Eu
posso distribuir todos os meus bens entre os pobres e entregar o meu corpo às
chamas para salvar alguém, se o meu coração não estiver junto, nada disso vai
me adiantar.
O Primeiro Testamento diz que a misericórdia é um ponto de
ruptura com o paganismo. Desde muito cedo Israel entendeu que não adiantaria
chegar-se para Deus pedindo o extermínio do inimigo, e invocá-lo para
satisfazer a sua sede de vingança. Através de duras experiências foi aprendendo
que para ser povo de Deus, exigia a tendência de ser misericordioso, porque o
seu Deus é um Deus de misericórdia. Pode ser que aos olhos da modernidade a Lei
de Talião: olho por olho, dente por dente seja uma crueldade, mas para os
antigos era um exercício bem complicado. Entre os povos da antiguidade
prevalecia o Anátema, o extermínio, o genocídio. Mas em Israel não poderia ser
assim, quem experimentou a misericórdia de Deus, tem que colocar um freio na
sua vingança, e o olho por olho era justamente esse freio. Dali para frente era
permitido somente olho por olho, dente por dente. Não mais a matança
desenfreada.
Mas a misericórdia não para aí, ela avança, ela progride até
alcançar o perdão. O povo de Deus começa a aprende a perdoar e os seus
cânticos e provérbios ensaiam um novo tom: O caminho das pessoas boas e direitas é como a luz da aurora, que vai
brilhando mais e mais, até se tornar dia perfeito.
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