Os sete pecados capitais, Pieter \Bruegel |
É
o melhor correspondente do grego pleonexia
(de pleon echein, ter mais) que nos
LXX e no Segundo Testamento designa a sede de possuir sempre mais sem se preocupar
com o outro e até à sua custa. A cobiça coincide em grande parte com a
concupiscência, perversão do desejo (epithymia),
mas parece acentuar-lhe determinados traços: é uma concupiscência violenta e
quase frenética (Ef 4,19), especialmente contrária ao amor do próximo,
sobretudo aos pobres, e tendo por objeto antes de tudo os bens materiais, as
riquezas, o dinheiro.
Como
os filósofos gregos, a Bíblia descreve os males que a cobiça engendra, mas ela
vai até à sua essência religiosa colocando-se, para julgá-la, numa altura
inacessível ao paganismo: além de ferir o próximo, a cobiça constitui, ao ofender
o Deus da Aliança, uma verdadeira idolatria.
Primeiro
Testamento
Manifestações e consequências.
Narradores, profetas e sábios
denunciam as violações dos direitos do próximo inspiradas pela cobiça. Ela é que
leva o comerciante, muitas vezes desonesto, a falsificar as balanças, a
especular e a ganhar dinheiro com tudo, leva o rico a extorquir penhores, a
açambarcar propriedades, a explorar os pobres, até pela negação do merecido
salário, leva o chefe e o juiz a exigir suborno para infringir o direito.
Ela
aparece assim diretamente oposta ao amor do próximo, e principalmente aos pobres,
que a Lei deve proteger contra ela. Enquanto Javé prescreve: Não endurecerás o teu coração (Dt 15,7),
o cúpido é um malvado de alma ressequida, que se mostra impiedoso. Dominados
apenas por seu interesse, os chefes cúpidos, como lobos que estraçalham sua
presa, recorrem até à violência para aumentar os seus ganhos e afirmar a sua
vontade de dominação (Ez 22,27).
Essência religiosa.
Mas os cordeiros que os lobos estraçalham pertencem a
Javé, o Deus da Aliança. É a ele que em última análise a cupidez vem a ofender:
ela é um desprezo blasfemo. Muito mais, o Primeiro Testamento pressente o
caráter idolátrico da mesma, e a tradição javista imprime o aspecto da concupiscência
ao ato pelo qual Adão e Eva, querendo ser como deuses, negam sua confiança e
sua dependência de criaturas. O Gênesis assim sugere que a cobiça está na
origem de todo pecado, ao querer desfrutar para si e considerar como apenas
seu aquilo que vem do amor de Deus para o seu serviço, o pecador coloca um bem
criado, e afinal a si próprio, no lugar de Deus. Por isso o Targum, comentando o mandamento de não
cobiçar, identifica os pagãos, pecadores por excelência, aos que cobiçam.
Quanto a Paulo, pensando provavelmente no relato de Gn reduz a esse mesmo mandamento
toda a Lei (Rm 7,7) e resume todos os pecados da geração do deserto na cobiça,
expressão da recusa da experiência espiritual imposta por Deus. Correndo atrás
dos bens precários, sempre insatisfeito, o cobiçoso será punido por seu
desprezo a Deus e pelos danos infligidos ao próximo: A cobiça leva à perdição aqueles em que ela habita (Pv 1,19),
enquanto aquele que odeia a cobiça prolongará os seus dias (Pv 28,16). (continua)
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