O Pagador de Promessas, Lidianne Andrade |
Sacrifícios e ofertas
não quiseste; abriste os meus ouvidos; holocaustos e ofertas pelo pecado não
requeres.
Leia Salmos 40
Texto do rev. Jonas Rezende
Zé do Burro é o protagonista da história de Dias Gomes em O
pagador de promessas, que trouxe para o cinema brasileiro, 1962, o importante
prêmio do Festival de Cannes. É a trágica saga de um homem simples que se sente
obrigado a pagar uma incrível promessa feita em intenção do seu animal de
estimação. Assim sendo, o penitente atravessa o sertão até chegar a uma
importante igreja, carregando pesada cruz, porque acredita que seu burro havia
sido salvo por um milagre de Deus. Para pagar o seu voto o homem sofre, perde
a fidelidade da mulher e, finalmente, a própria vida.
Neste salmo, que mais uma vez me emociona, Davi não mostra
dúvida alguma: Deus não é sádico; jamais coloca sobre os ombros humanos uma
religião de sofrimento e penitência. Ele disse, e palavra divina não volta
atrás. Ele disse: misericórdia quero, e não sacrifício. O salmista se alegra
porque sabe que é bem-aventurado o homem que põe no Senhor a sua confiança. E
sua experiência é expressa com beleza poética e força espiritual: esperei
confiante pelo Senhor; ele se inclinou para mim e me ouviu quando clamei por
socorro.
Deus ouve o nosso clamor, sem pré-requisitos, sem exigir
carteira de bons antecedentes, sem estabelecer sacrifícios e provações. Porque
o seu amor é perfeito. Para o teólogo Niebhur, Deus não nos ama por causa dos
nossos merecimentos, mas é o amor divino que cria em nós um valor especial, na
proporção em que somos seus destinatários. E preciso, no entanto, lembrar que a
resposta do ser humano àquele que o amou primeiro não tem limites. A história
da Igreja nos informa que muitos santos consideravam o martírio um privilégio.
A palavra mártir vem do grego e significa testemunha. No caso, através da
morte.
Mas a verdadeira comunhão com Deus também dispensa penitências
e sofrimentos, porque a violência contra o nosso corpo e espírito, ainda que não
fosse destrutiva, não produziria bem algum para nós ou aos olhos de Deus. É de
Santo Agostinho esta oração: toma-me, Senhor, porque eu não posso dar-me a mim
mesmo; cuida de mim, Senhor, porque de mim mesmo não posso cuidar-me.
Ouvi a respeito de um louco que saiu à rua com um balde de
água e uma tocha acesa. Nem era preciso que lhe perguntassem sobre o significado
daquilo tudo, porque ele mesmo já ia dizendo: com a tocha queimo o céu, e apago
o inferno com o balde de água. Quero ver quem ama a Deus, não pelo prêmio do
céu ou por medo do inferno...
O filho pródigo da parábola de Jesus, ao voltar para a casa
paterna, pensou pedir ao pai que o recebesse como um de seus trabalhadores. Mas
ele não teve de fazer essa proposta, uma vez que o pai foi ao encontro do
filho, e festejou o seu regresso com alegria e ternura.
O salmista conhece o coração do divino Poeta. Sabe que Deus
nos diz: misericórdia quero, e não sacrifício. É por isso que ele tem aguda
autocrítica, mas não se entrega a inúteis e prejudiciais mortificações. Veja
só como é profunda e sensível a maneira como termina o seu poema:
Eu sou pobre e necessitado, porém o Senhor cuida de mim; tu meu amparo e o meu libertador; não te detenhas, ó Deus meu!
Faça também sua a oração de Davi.
Nenhum comentário:
Postar um comentário