Não há vinde sem ide, ou vice-versa

Vinde a mim, Joann Reed m 1967
A combinação perfeita de dois verbos colocados no imperativo distingue clara e objetivamente a ministério de Jesus dos de outras lideranças, sejam elas religiosas ou políticas. São verbos que têm um alcance para muito além das conjugações e sentidos que normalmente empregamos. São também verbos corriqueiros, que se não analisados com a profundidade devida, indicariam sentenças comuns do cotidiano de qualquer pessoa.

Uma dessas conjugações se refere ao imperativo do verbo vir, quando Jesus em várias ocasiões não se furtou em declarar: Vinde a mim. Algumas vezes ele foi muito literal: Vinde após mim, e eu vos farei pescadores de homens. Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Outras vezes se deu através de chamados com pessoais, mas de semelhante contundência: Se queres ser perfeito, vai, vende teus bens, dá-os aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me! Vinde, comei. Nenhum dos discípulos ousava perguntar-lhe: Quem és tu? Porque sabiam que era o Senhor.

Como foi dito, esse vinde de Jesus não teve apenas um alcance imediato, como um convite apressado e de última hora. Ele se perpetuou e ainda se perpetua na vocação dos seus discípulos posteriores, aqueles a quem chamou de mais bem aventurados, justamente porque aceitaram o seu chamado sem o terem conhecido pessoalmente: Vinde comigo e vede um homem que me disse tudo quanto tenho feito. Será este, porventura, o Cristo? Mas não é somente isso, ele também extrapola o tempo no qual estamos condicionados a viver: Vinde, benditos de meu Pai! Entrai na posse do reino que vos está preparado desde a fundação do mundo. Enviou ainda outros servos, com esta ordem: Dizei aos convidados: Eis que já preparei o meu banquete; os meus bois e cevados já foram abatidos, e tudo está pronto; vinde para as bodas.

Contudo, se esse verbo fosse tomado isoladamente, poderia parecer que Jesus estava tão somente, como os que se autoproclamam Messias o fazem, tentando arrebanhar um poderoso exército para segui-lo em alguma conquista pessoal ou algum delírio inconsequente. O vinde de Jesus cairia num enorme vazio se não tivesse um objetivo maior do que simplesmente juntar um grande contingente. É por isso que ele sempre vem seguido de perto por um outro imperativo de igual importância: o ide.

O ide de Jesus não somente complementa o seu chamado, mas também indica o verdadeiro sentido desse chamado. É um vinde para ir, não para ficar. Um vinde para ser, e não para ter. Um vinde para compartilhar, e não para reter.

O ide que Jesus proclama tem também alcances temporais diversos, pois para alguns foi dado sob a forma de uma recusa inesperada a pedidos sinceros para ficar, como foi o caso no endemoninhado gadareno, que depois curado foi mandado de volta à comunidade que rejeitara: Volta para casa e conta aos teus tudo o que Deus fez por ti. Então, foi ele anunciando por toda a cidade todas as coisas que Jesus lhe tinha feito. Para outros, no entanto, o ide ficou subentendido após revelações íntimas ou gestos simples que fizeram com seus corações ardessem de forma inusitada, como foi o partir de um pão na presença dos caminhantes de Emaús: E disseram um ao outro: Porventura, não nos ardia o coração, quando ele, pelo caminho, nos falava, quando nos expunha as Escrituras? E, na mesma hora, levantando-se, voltaram para Jerusalém, onde acharam reunidos os onze e outros com eles.

Que fique para nós essa mensagem eterna de compromisso, tanto de ir, quanto de vir. Pois se as verdades bíblicas que enaltecem a coragem daqueles que aceitaram integralmente o mandamento do ide, como o apóstolo Paulo, elas também o relacionam estreitamente com a volta às origens, que é a fonte de águas limpas. É por isso que esse apóstolo não se furta em deixar claro que tudo o que ele faz é apenas resultado e consequência do que foi feito por ele: O que eu recebi do Senhor, também vos entreguei.

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