O que é FOME e SEDE?

Um brasileirinho com fome, foto de 2011
A fome e a sede, por exprimirem uma necessidade vital, revelam a precariedade da existência humana, e revestem-se, por isso, de certa ambivalência: Pv 30.8 - dá-me o pão que me for necessário; para não suceder que, estando eu farto, te negue e diga: Quem é o Senhor? Ou que, empobrecido, venha a furtar e profane o nome de Deus. Ter fome e sede é uma experiência positiva que deve abrir a mente para Deus; mas o estado do faminto é um mal que Deus não quer e que se deve procurar suprimir. Assume, assim, as proporções de um fato coletivo. O flagelo da fome, por exemplo, a Bíblia vê nele uma calamidade, sinal de um julgamento divino.

No deserto, Deus fez seu povo passar pela fome para prová-lo e conhecer o fundo do seu coração. Israel tinha que aprender que em sua existência dependia totalmente de Javé, o único a lhe propiciar alimento e bebida. Mas para além e para mais fundo que tais precisões físicas, Israel tem que descobrir uma precisão mais vital ainda, a necessidade de Deus. O maná que vem do céu evoca justamente aquilo que sai da boca de Deus, isto é, a sua Palavra, a Lei, na qual o povo deve encontrar a vida. Mas o povo não o compreende e só pensa nas panelas de carnes do Egito.

Instalado na sua terra e saciado com seus bens, Israel, esquecendo a lição do deserto, os atribui ao próprio mérito e deles se gloria diante de Javé. E’ necessário que Deus reconduza seu povo ao deserto para que, morrendo de sede, chorando seu trigo perdido e suas vinhas devastadas, o coração de Israel desperte e sinta outra vez a fome e a sede essenciais, a de ouvir a palavra de Javé: Am 8.11 - Eis que vêm dias, diz o Senhor Deus, em que enviarei fome sobre a terra, não de pão, nem sede de água, mas de ouvir as palavras do Senhor.

A necessidade e o desejo dos bens que Deus reserva aos que o amam se exprimem constantemente nas imagens da refeição, do pão, da água, do vinho. Tem-se fome do banquete que Javé sobre a montanha prepara para todos os povos, tem-se sede da sabedoria que desconserta, do vinho inebriante que é o amor, busca-se receber de Deus, sem pagar, a bebida dos sedentos e o alimento que sacia. Mas é da água mais pura de todas que se tem sede, do único vinho cuja embriaguez seja a vida, isto é, de Deus; e o próprio Deus está pronto a satisfazer esse desejo: Sl 81.11 - Abre bem a boca, que eu a encherei.

A provação da fome e da sede deve permanecer como algo excepcional. Os pobres são viventes apelos para os que deles se aproximam. Um dos deveres primordiais de Israel é dar pão e água a seu irmão, a seu compatriota e a quem quer que deles precise, até mesmo ao seu inimigo. Isso é praticar a justiça e tornar o jejum agradável a Deus. No fim, o próprio Javé intervirá em favor dos famintos para convidá-los ao banquete que saciará plenamente sua fome e sua sede.

Em Lc 1.53, Jesus proclama que serão saciados os que têm fome e sede. Ele dá início à sua missão tomando sobre si a condição de faminto e de sedento. Posto à prova, como Israel no deserto, ele afirma e demonstra que a necessidade essencial do homem é a Palavra de Deus, a vontade do Pai, que ele faz dela seu alimento e que dela vive. Sobre a cruz, tendo sorvido o cálice que seu Pai lhe havia dado, sua sede de crucificado é inseparável do desejo que tem que fazer cumprir toda a Escritura, de completar a obra do seu Pai, mas também de comparecer diante da sua face.

Jesus sacia e ao mesmo tempo suscita fome e sede. Como outrora Deus no deserto, Jesus alivia a fome do povo que o segue, e se preocupa também em suscitar o desejo da Palavra de Deus, do verdadeiro Pão que é ele próprio, e o desejo da água viva que é seu Espírito. Suscita sede dessa água na samaritana, como convida Marta a desejar a sua palavra, a única necessária.

Para os discípulos de Jesus, o dever de alimentar os que têm fome é de maior urgência que nunca. A sede torturante na Geena é o que espera aquele que não enxergou o faminto à sua porta; a recompensa é para aquele que deu um copo d’água a um dos discípulos de Jesus. É sobre isso que o julgamento se fará, pois alimentar o faminto, socorrer o sedento, é saciar através dos seus irmãos a fome e a sede de Jesus. Dessa caridade com que saciamos os sofrimentos alheios devemos sempre ter sede; sua fonte está aberta, gratuita, para as almas desejosas, sedentas de Deus e da visão da sua face, sedentas da verdadeira vida: Is 55.l - Ah! Todos vós, os que tendes sede, vinde às águas; e vós, os que não tendes dinheiro, vinde, comprai e comei; sim, vinde e comprai, sem dinheiro e sem preço, vinho e leite. 

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