![]() |
Deus descansou no 7º dia, gravura do século XIX |
Tanto o grego quanto o hebraico têm vários termos para descanso,
cada um com um significado. Abster-se do trabalho, o repouso diário, e uma
série de propostas são inferidas a partir dele, pois desde cedo Israel conheceu
a instituição do sábado: um dia de descanso por semana. O Código da Aliança
alega uma motivação muito humana: deve ser um dia de repouso para os
trabalhadores e para os animais de carga.
Também à terra deve-se dar descanso, de sete em sete anos.
Conforme Dt 5.15 o descanso do sábado deve lembrar a libertação do Egito. A
tradição sacerdotal vê no descanso semanal uma participação no descanso do
próprio Deus depois dos seis dias de trabalho da criação. Observando o
descanso do sábado, o homem comporta-se como filho de Deus.
Diversos textos falam de um descanso no sentido político: a
nação descansa quando está livre de guerra, de inimigos e das calamidades. Em Juízes
tal situação de descanso é citada seis vezes. Também I e II Cr adotaram esse
termo pelo menos cinco vezes. Em todos esses textos é usada a fórmula estereotípica:
a terra ficou anos em descanso, depois da
relação de uma vitória de Israel contra algum inimigo, seguida por um período
de paz. Conforme Zc 1.11 o mundo inteiro gozou de descanso sob o governo
de Dario.
Semelhante a esses textos, mas de conteúdo mais religioso, o tema do descanso em Dt é definido como paz e segurança estabelecidas por Javé
na terra da promissão, depois das lutas e da longa peregrinação pelo deserto. O
tema já ocorreu em Gn 49.15 como também nos profetas, sendo, portanto, de
origem anterior à escola deuteronomística, mas foi usado, sobretudo, nas obras
deste. Dt 12.9-12 pode servir de ponto de partida: no limiar da terra prometida, Moisés diz ao povo: Até hoje ainda não
entrastes no descanso e na propriedade de Javé. Habitareis na terra e o Senhor
vos dará descanso de todos os inimigos ... lá devereis servir a Javé”. Josué
propõe esse descanso como ideal a ser conquistado, e que no fim do livro foi
alcançado.
Foi no templo de Jerusalém que esse descanso chegou à sua
plenitude. Na inauguração do templo, Salomão louva Javé por ter dado descanso
a seu povo, de acordo com as suas promessas, pois o templo não significava apenas
o lugar, mas também uma situação de descanso. Também no Salmo 95.11 encontra-se
o tema deuteronomístico do descanso, embora num contexto negativo, Javé castiga
a infidelidade de Israel: não entrarão no
meu descanso. Notemos que Javé chama a terra prometida o meu descanso. Em
alguns outros textos encontramos a ideia de que é Javé quem descansa: a arca e
Sião são o lugar onde Javé descansa.
Sem nexo intrínseco com os significados acima expostos, alguns
desses verbos nos textos mais recentes podem significar a morte ou a situação
após a morte. Ainda assim a situação de um falecido é preferível à do louco,
pois o primeiro foi descansar. O descanso eterno é preferível a uma doença
diuturna. Conforme Jó 3.17-19, os mortos descansam no xeol. Trata- se, nesses textos, de um descanso muito relativo: o de
ficar livre das misérias deste mundo. Tal descanso, por si só, ainda não tem
qualquer conteúdo positivo. Uma exceção é Is 57.2, que fala da sorte dos justos
depois da morte: entram na paz; descansam nos seus aposentos, enquanto aguardam
a ressurreição.
Nos escritos apócrifos do judaísmo, o descanso pode
significar a morte como fim definitivo. Com muito mais frequência, porém, o
termo indica as diversas fases em que se imaginava o estado escatológico do
justo: o tempo messiânico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário