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Tribunal da Inquisição, Francisco de Goya |
Texto do rev.
Paulo Schütz.
Hoje se
combate a intolerância religiosa. Mas, será que o máximo que devemos fazer é
tolerar as outras religiões? Será que não existe nelas nada que proceda do
mesmo Deus que adoramos?
Já no
primeiro capítulo de sua epístola aos romanos, o apóstolo Paulo declara que “os
atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua
própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo
percebidos por meio das coisas que foram criadas.” Seu propósito é demonstrar
que os pagãos, que desconhecem a Lei dos judeus, nem por isso estão livres da
“ira de Deus contra toda impiedade e perversão dos homens”. Por isso, prossegue
descrevendo essas perversidades, resultantes da desobediência, mas encontramos
no Antigo Testamento referências a
pagãos que, ao contrário, responderam positivamente com relação aos propósitos
divinos, o que também confirma a declaração do apóstolo. Os casos mais conhecidos
e mais ilustrativos são o de Raabe, uma prostituta da periferia de Jericó, e de
Ciro, o poderoso imperador da Pérsia.
E mais, por
ocasião da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, “toda a multidão de
discípulos passou, jubilosa, a louvar a Deus em alta voz, por todos os milagres
que tinham visto”, pelo que alguns dos fariseus solicitaram ao mestre que os
repreendesse. Agora coube a este assegurar que “se eles se calarem as próprias
pedras clamarão”. Lucas narra esse episódio no capítulo dezenove de seu
evangelho.
Essas
palavras de Jesus soam de imediato como uma possibilidade muito remota ou
apenas hipotética, mas elas são bem reais e não foram pronunciadas à toa. As
igrejas, por exemplo, nos últimos anos, têm apoiado timidamente a promoção dos direitos
da pessoa humana. Mas já foi pior; por muitos anos, ou séculos, elas se calaram
e até sustentaram os regimes totalitários, o imperialismo em todas suas formas,
defenderam e praticaram a tortura, negaram a humanidade dos negros e das
mulheres, promovendo a escravidão, a segregação e a discriminação. É inegável
que os avanços destas conquistas em diversos países deveram-se principalmente
aos pensadores e movimentos humanistas e que os cristãos, apenas tardiamente e
a duras penas vão aos poucos se rendendo a esses clamores e descobrindo que
eles constituem o próprio cerne do ensino bíblico, tanto do antigo como do novo
testamento.
Essa triste
realidade reedita aquelas às quais se referem as palavras de Jesus nos
capítulos cinco e sete do evangelho de João. Essas duas passagens devem ser
lidas integralmente, porém, em resumo, o mestre repreende os judeus na primeira
porque examinam as escrituras por julgar
ter nelas a vida eterna, mas, mesmo
assim não creem nos seus escritos, porque aceitam glória uns dos outros. Na
segunda passagem, embora referindo-se a si mesmo, ele faz uma afirmação
genérica: Se alguém quiser fazer a
vontade de Deus, conhecerá a respeito da doutrina.
Infelizmente
estamos habituados a pensar na vontade do Pai como algo misterioso inacessível,
escondido. Mas, por que ele faria isso, se deseja que os homens a pratiquem? A
Caim ele revelou simplesmente: “Se procederes bem, não é certo que serás
aceito?” Penso que os humanistas apenas desejaram proceder bem, buscaram o que
era certo, justo, bom, e descobriram a vontade de Deus, talvez só em parte, mas
clamaram, antes que as pedras o fizessem. Já os cristãos mais influentes,
interessados em sua própria glória, tornaram-se incapazes de crer nos escritos
que alardeiam aos quatro ventos e, quando não repreendem os que clamam,
simplesmente se calam. Carregam um baú cheio de preciosidades inestimáveis, mas
desconhecem seu conteúdo, porque jogaram a chave fora.
Referências
bíblicas:
Romanos
1.18-23; Josué 2.1-21; Isaías 45.1-7; Lucas 19.37-40; João 5.19-47; 7.14-18;
Gênesis 4.1-7.
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