Partida de Abraão, Jozsef Molnár em 1850 |
Texto do Rev. Jonas Rezende.
Vezes
sem conta, a Bíblia usa o verbo lembrar no imperativo: lembrem-se. Como se um insinuante esquecimento,
injusto e até criminoso, representasse um perigo grave que é preciso evitar:
lembrem- se da mulher de Ló, lembre-se do dia de sábado, lembre-se dos dias da
antiguidade, lembre-se do seu criador, lembrem-se da lei de Moisés, lembrem-se
dos encarcerados...
E
no salmo, que mais uma vez considero com você, o poeta adverte: lembrem-se das
maravilhas que o Senhor fez, dos seus prodígios e dos juízos de seus lábios.
Acredito que, para o salmista, quem se esquece da
ação divina começa a morrer, como um ser humano sem continuidade histórica, sem
raízes, sem passado. Ou como um povo que perdeu a sua memória, as sua tradição,
os seus mitos, seus sonhos, e já começa também a deixar de ser.
Temos
que lembrar os amigos que deixamos pelo caminho, os parentes mais pobres, os
velhos esquecidos de nossa família, padrinhos e afilhados, cujos próprios nomes
esquecemos.
Temos
que lembrar de pagar o dinheiro que pedimos emprestado, as nossas contas, as
prestações que já estão atrasadas, o dinheirinho para ajudar o jornaleiro a
viver. Chega de sonegação; temos de pagar o imposto de renda.
Temos
que lembrar os doentes que sofrem, os mestres antigos, os aniversários das
pessoas que empobreceram, os túmulos abandonados, os números de telefones que esquecemos,
a carta não-respondida, a visita que sempre ficou para depois. E o sorriso que
perdemos por falta de uso.
Temos que lembrar que a
água é preciosa, que a terra é a nossa casa maior e precisamos cuidar dela, não
poluí-la,
não atirar mais lixo pela janela do carro, que isso é
coisa de irresponsáveis. De pessoas sujas. Temos de lembrar que o nosso corpo
deve ser mais amado.
Temos que lembrar de
cuidar da sua higiene, fazer exercícios, comer menos, abandonar o cigarro,
conhecer os Alcoólicos Anônimos,
dar tempo ao lazer, aceitar o prazer lícito, como
presente de Deus e da vida.
Temos que lembrar as
guerras que afligem o mundo e, porque já muito divulgadas, não são mais
notícia. No entanto, milhões de mortos e feridos se acumulam, como resultado
dessas guerras esquecidas. Esquecer é adotar a posição de cúmplice. E há uma mina mutilando, neste momento uma
criancinha distraída.
Temos que lembrar as
nossas decisões, os nossos compromissos e os votos que fizemos ao nos
engajarmos em um movimento de testemunho cristão. Lembrar que um dia já
dissemos, com o mesmo fervor dos apóstolos: não podemos deixar de falar das
coisas que vimos e ouvimos; importa antes obedecer a Deus que aos homens.
É preciso lembrar a
luta de Martin Luther King e o seu sonho de um mundo melhor, sem vales nem
montes, sem desníveis e injustiças. Seu bom combate deve ser também o nosso.
É preciso lembrar a
morte de um santo como o Mahatma Gandhi, em um holocausto de amor. E ele só
pedia que todos fizessem o favor de viver em paz. E de resistir pacificamente.
É preciso lembrar o
padre Maximiliano Kolbe. O homem que se entregou para morrer no lugar de
Francisco, um pai de família, no campo de concentração nazista, em Auschwitz. E
preciso lembrar Jesus Cristo. Viver em memória dele. Temos tanto e muito mais
ainda para lembrar...
Quem esquece, começa a morrer.
Eu não quero ver você entre eles.
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