Batismo de Jesus, Portinari em 1952 |
Texto
do rev Jonas Rezende.
Harvey Cox, importante teólogo moderno, acredita que o
cisma que separou os cristãos do judaísmo representou uma quebra de continuidade
que empobreceu a Igreja e os judeus. Concordo com ele e, por isso, uma vez mais
volto a este salmo. Poderia ser outro poema que falasse do ungido de Deus. Ou
mesmo qualquer livro do Antigo Testamento que focalizasse o mesmo assunto.
Porque a menção do ungido tem sempre um destinatário próximo, mas aponta, mais
longe, para o Ungido, que se confunde com o Messias.
A Igreja entende que a
aplicação final de todos esses textos se ajusta na pessoa do Cristo. Até porque
as três palavras significam a mesma coisa. Messias é a forma hebraica, e Cristo
a palavra grega que designa o Ungido de Deus.
Sabemos, no entanto, que as ideias centradas no Messias são diferentes na tradição judaica
daquelas que se tornaram familiares aos cristãos. Mas há pontos de toque,
inúmeros vasos comunicantes entre as concepções de judeus e cristãos, que se
baseiam nos mesmos textos do Velho Testamento. Entendo que as diferenças entre
as duas correntes religiosas se prendem muito mais a problemas, mágoas e
paixões históricas do que a uma análise serena das referências bíblicas que nos
são comuns.
Veja só. Os judeus continuam a esperar o Messias. Já os
cristãos, que identificam o Messias com Jesus de Nazaré, vivem a expectativa da
sua volta. No frigir dos ovos, a diferença deveria não pesar tanto, não fossem
os conceitos ligados à pessoa do Ungido ou Messias. A mesma palavra é utilizada
para os reis que assumiam a direção do povo: eles eram ungidos pelo
próprio Deus. Mas, no livro do profeta Isaías, Ciro, um rei pagão que perseguiu
os judeus, é também chamado de meu ungido ou messias,
indicando que, genericamente, haveria propriedade em designar por esse nome
honroso quem cumprisse um papel histórico que correspondesse à vontade divina
voltada para a História do ser humano. O que, porém, parece pacífico entre as
duas correntes é que há um Ungido especial que cumpre todas as expectativas
divinas e humanas. Um Messias ou Cristo de Deus.
Há
grupos de judeus que repetem o seguinte apelo, que mais parece uma palavra de
ordem: Messias já! Por seu turno, cristãos mais impacientes chegam a fazer
cálculos e cotejam profecias para estimar quando volta o seu Cristo. Maranata!
O salmo
aberto diante de nós se refere, num primeiro plano, a um rei que assumia o
governo de Judá. Mas, profeticamente, é entendido por judeus e cristãos como
uma página que aponta para o Messias ou o Cristo. Por isso, Deus ri e zomba de
quem pensa derrubar o seu reinado.
Resta
uma diferença básica entre a concepção de judeus e cristãos sobre o Messias. O
povo hebreu espera um líder que coloque
Israel acima de todas as nações. Isso é claro, mesmo no Evangelho. O servo
sofredor que encontramos no profeta Isaías personifica o povo esmagado que o
Messias vem libertar. Para os cristãos, Messias e servo sofredor são faces da
mesma pessoa. O Cristo aceita o caminho da cruz e do sofrimento, na libertação
que traz à terra.
Duas
concepções que não precisariam se excluir, como Harvey Cox e tantos de nós
gostariam. É interessante que um dos hinos de Natal tem música e letra que
poderiam ser usadas pelos judeus:
Vem,
ó vem Emanuel,
liberta o povo de Israel...
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