O Banquete de Absalão, Bernardo Cavallino (1616-1656) |
Sempre ouvi dizer que os povos semitas, mais particularmente
os judeus da Bíblia, tinham por tradição dar nome aos seus filhos de acordo com
as características físicas, habilidade, personalidade ou profissão dessa pessoa.
Simão Pedro, devido ao seu temperamento explosivo ficou conhecido como Simão
Boanerges, o que significa Simão Filho do Trovão. Mas se nos concentrarmos no
nome que Davi deu ao seu terceiro filho vamos ter que concluir que esta regra
tende a se fixar mais na expectativa do que propriamente na realidade.
Na sua curta existência, Aba Shalom ou Absalão, como foi
traduzido, não conseguiu ir além de representar a mais tosca e bizarra negação
do real significado do seu nome: Pai da Paz. Diante dos fatos que nos contam os capítulos de 13 a 18 do segundo livro de Samuel acerca da
vida e morte desse rapaz, eu imagino que, depois de Adão, ninguém mais fez a si
mesmo com tanta propriedade a conhecida pergunta que uma ocasional decepção com
a educação de um filho nos obriga a fazer: Onde foi que eu errei?
O ódio contra seu pai veio num crescendo que talvez nem a
usurpação do trono e consequente morte do rei poderiam aplacar. Ele queria
mesmo manchar o nome de Davi com uma infinidade de afrontas, de tal forma que
este nome fosse definitivamente apagado da história. Isso colocou Davi na
terrível posição de ter que guerrear contra o próprio filho, para salvar a si, seu reinado e quem sabe boa parte da sua família, com o objetivo de conseguir
a mais inglória das vitórias.
Se tivermos que dar um nome a batalha que culminou com a
morte de Absalão deveríamos chamá-la de a luta entre o mal e o mal. A batalha
para a qual não existe alternativas minimamente aceitáveis. Tanto a vitória
quanto a derrota só trazem desespero, dor e a sensação de uma perda
infinitamente irreparável.
Se alguém tem a ilusória pretensão de nunca se encontrar
nessa situação, esqueça, pois ela não é mais do que o reflexo ampliado da luta
diária que travamos conosco mesmo. O apóstolo Paulo, muito antes da psicologia
moderna, detectou essa luta dentro de si, e descobriu as suas origens: o pecado
que controlava de forma absurda a sua vontade inconsciente. Dizia ele: o bem que eu quero fazer, não faço. Mas o
mal que não quero fazer, esse está sempre diante de mim.
Pecado de pai contra filho e de filho contra pai, quando não
devidamente perdoados, levam inexoravelmente a uma batalha da qual não se
poderá nunca apontar um vencedor. Somente sobreviverão perdedores que
dificilmente obterão o conforto de sentirem-se perdoados e que jamais poderão perdoar a si mesmos.
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