A pregação de João Batista, Bartholomeus Breenbergh em 1634 |
O que tem a noiva é o
noivo; o amigo do noivo que está presente e o ouve muito se regozija por causa
da voz do noivo. Pois esta alegria já se cumpriu em mim. Convém que ele cresça
e que eu diminua. João 3.29s
A Bíblia nos passa uma imagem de João Batista bastante rude.
Como agravante, qualquer artista que ousou pintar um quadro dele, nos fez
conhecer também essa marcante característica: um homem estranho, de hábitos estranhos:
Mc 1.6 - As vestes de João eram feitas de
pelos de camelo; ele trazia um cinto de couro e se alimentava de gafanhotos e
mel silvestre. Um homem de pouca
fala e muita agressividade nas palavras: Mt 3.7b - Raça de víboras, quem vos induziu a fugir da ira vindoura? Em
resumo: um tipo com quem não gostaríamos de cruzar numa rua escura e deserta.
Na hipótese extrema, os mais radicalmente avessos à sua
imagem diriam que o ministério e a vida de João foram adequados à época, mas
que não vingariam nos dias de hoje. Também, com Hollywood tentando a todo tempo
nos fazer crer que o belo é quase que obrigatoriamente bom, confiável e justo,
e que o mal sempre vem através daquilo que consideramos grotesco, desconfia-se
mesmo que João Batista jamais teria entre nós a credibilidade que angariou
entre os seus contemporâneos.
Apesar de tudo isso, nós que conhecemos o evangelho
diretamente da Bíblia, não conseguimos vê-lo como uma pessoa negativa ou
desagradável. Pelo contrário, João Batista é para nós a repercussão mais fiel da voz dos profetas do passado, seja nos costumes, nas palavras ou na indumentária. João
também veio preencher aquele vazio que período intertestamentário deixou nas
Escrituras. Sua missão parece que é a de ser uma ponte entre as últimas palavras
do Primeiro Testamento e os primeiros escritos do Segundo. A ligação pouquíssimo
compreendida entre lei e graça.
Mas eu queria me referir nessa hora ao seu magnífico sermão
que mal conseguiu preencher quatro versículos da Bíblia. Diante de uma questão
complicadíssima, na qual todo o seu ministério estava sendo avaliado, João se
vê na difícil situação de ter que abaixar o volume da sua voz, conter o ímpeto
das suas denúncias e guardar temporariamente o seu machado. Ele faz tudo isso
porque enxerga a necessidade de apresentar uma outra pessoa, um outro pastor,
um outro ministério, que embora fosse totalmente diferente do seu, ele sabia que era ainda
maior e mais definitivo do que tudo que ele pregara até então. Eu queria falar
dessa estupenda inspiração que o levou a proferir aquele que eu penso ser o
mais belo, mais objetivo e mais necessário sermão não proferido por Jesus.
Imagino que podemos transcrevê-lo da seguinte maneira:Um grupo de fiéis a Deus já consolidado e estruturado vê
nascer bem perto de si uma outra corrente de pensamento, que embora pregue a
mesma mensagem que vem pregando, se porta de modo diametralmente oposto
ao seu. Um grupo que sem deixar de lado a consciência sobre o pecado, vive uma
alegria espontânea e contagiante. Esse outro grupo tem também um pastor, que
embora fosse parente próximo do seu pastor, nem de longe se assemelhava a ele,
pois anda cercado de prostitutas, adúlteras, publicanos e gente da pior espécie.
Não apenas isso. Comia de tudo que lhe era oferecido, bebia vinho, tinha uma
belíssima túnica e, vez por outra, aceitava um presente caro, como um vidro grande
de nardo puro.
Eles vão a João reportar tudo isso na expectativa de que
seu pastor condenasse com veemência e até usasse violência contra esse pastor
moderninho e complacente. Nada disso! João consegue ver aí a oportunidade que
tanto esperava: a de mostrar a todos os que o seguiam a real motivação de toda
a sua vida e ministério. João aproveita para pregar talvez o seu último sermão.
Não somente o mais belo, mas aquele que todos os pastores, de todas as
denominações e de todas as épocas obrigatoriamente precisam ouvir, seguir e pregar:
– Vós mesmos sois
testemunhas de que vos disse: eu não sou o Cristo, mas fui enviado como seu
precursor. Eu sou apenas a mão que
aponta para ele. Eu sou apenas um servo inútil que tenta, quando muito, cumprir
com a sua obrigação. Não pensem vocês que estou triste ou decepcionado com Deus
por ser substituído. Foi para isso que eu vim, e quando essa hora chega, eu não
posso fazer outra coisa senão pular de alegria.
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