O velho é mesmo um traste?

Simeão e Ana, Aert de Gelder (1645-1727)
O justo florescerá como a palmeira, crescerá como o cedro no Líbano. Plantados na Casa do SENHOR, florescerão nos átrios do nosso Deus. Na velhice darão ainda frutos, serão cheios de seiva e de verdor, para anunciar que o SENHOR é reto. Leia Salmos 92

Texto do rev. Jonas Rezende.

Diante da escalada de morte que extermina nossos velhos nas casas de repouso, verdadeiros depósitos de condenados, também pelo descaso das famílias; numa sociedade em que o velho é traste, a começar da própria palavra, camuflada por uma expressão um tanto tola, como é terceira idade; acredito que este salmo, de autoria desconhecida, é muito oportuno.

O cenário é semelhante ao de tantos outros: a comparação entre aqueles que temem a Deus e os que só praticam a iniquidade. Os perversos serão punidos, mas os justos florescerão como a palmeira. E o salmista destaca que, ainda na velhice, eles darão frutos.

Não apenas entre os antigos hebreus, mas em diversas culturas, o papel dos velhos era de reconhecida importância social. Nas chamadas gerontocracias, o velho chegava mesmo a exercer o poder de governante. É interessante que o presbítero, figura central na organização da Igreja cristã, era o velho que colaborava com a sua experiência, como indica o próprio significado da palavra grega. E aí estão os estudiosos de diferentes áreas defendendo o ponto de vista de que muito se perdeu com a ausência dos avós, dentro da família atual.

E lamentável, mas com apenas quarenta anos aqueles que ainda irão viver uma outra metade de vida já estão alijados dos concursos e de grande parte das funções sociais. E a marginalização dos nossos velhos derruba seu autoconceito, de tal modo que eles próprios terminam acreditando na mentira de que só lhes resta morrer. Ser velho deixou de ser uma bela estação da vida - quando ainda s pode exercer a sexualidade, ter papel positivo dentro da família e em muitas outras esferas da sociedade - para ser alvo de verdadeira punição. A aposentadoria vil, na esmagadora maioria das vezes, s transforma em condenação injusta e cruel; perspectiva de miséria no fim da vida.

Mas o salmista, em nome de Deus, continua apregoando que o ser humano é capaz de frutificar na velhice, cheio de seiva e de verdor.

Agora, veja bem. Em muitas áreas sociais, nossos velhos aposentados estão sendo convocados de novo para ocupar suas funções, uma vez que não foram encontrados substitutos à altura deles. E há famílias que revisam a atitude de condenar os seus velhos aos asilos, quando a ternura dos vovôs pode ser um fator aglutinante na constelação familiar. Mas a mentalidade de criminosa discriminação da velhice está longe de ser banida. Aguardo o dia em que a poesia de Coelho Neto volte a ser verdadeira. E não mais pareça um cinismo repetir:

Não choremos, amigo, a mocidade, envelheçamos rindo,
envelheçamos como as árvores fortes envelhecem.
Na glória da alegria e da bondade,
agasalhando os pássaros nos ramos,
dando sombra e consolo aos que padecem.

Onde vamos deixar nossos avós?

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