Filho pródigo, Andrei Rabodzeenko (1961-) |
Uma pergunta paira no ar: Alguém aqui ainda pensa que o pai
amava mais o filho que foi para a terra distante do que o que ficou em casa? Se
é assim, que se leve em conta que o filho mais velho não aceitava sequer ser
amado na mesma intensidade que seu irmão perdido, assim como nós que ficamos em
casa, ele requer o amor do pai como se o direito de primogenitura valesse
também neste caso: sempre em porção dobrada. Não se espantem porque a nossa
realidade não é nem essa, nós o requeremos o amor total. Coitado. Se o filho
mais velho soubesse era igualmente amado, não teria trabalhado tanto para
ganhar a aprovação do pai que ele já tinha gratuitamente sem saber. Ele, como
nós, ele não viveria constrangido nem atribulado, sem imaginar que já estava
gozando deste amor a sua vida toda. Meu
filho, tu sempre estás comigo; tudo o que é meu é teu. Entretanto, era preciso
que nos regozijássemos e nos alegrássemos, porque esse teu irmão estava morto e
reviveu, estava perdido e foi achado. Aqui ele demonstra a plenitude do
amor em que o filho mais velho não conseguiu acreditar. Tudo o que o pai tinha
era dele, mas ele, exatamente como fazemos, preferiu acreditar antes na sua
própria capacidade de realização, na sua integridade moral e na sua bondade. É
nessa hora que, com profundo pesar, o pai descobre que aquele filho tão
honesto, tão trabalhador e tão bom nunca tinha estado em casa por um instante
sequer.
Contudo, antes que o amaldiçoemos, vamos admitir que a
maioria de nós pensa da mesma forma. A maioria de nós trabalha pela recompensa.
Mas será que nós não vamos receber nada por termos sido fiéis e constantes, por
termos sido atuantes e presentes? Claro que sim. Sabem qual é a recompensa? Não
é o amor exclusivo, mas aquele amor que o filho mais novo deixou de desfrutar quando
foi para a terra distante: a presença consoladora, o gozo da comunhão plena com
o amor do pai durante aqueles longos anos. Lá no seu exílio o pródigo reconhece,
antes mesmo que o mais velho, que o amor do pai era tão grande que não deixava de
fora nem os estranhos, quanto mais os filhos. Mas quando o nosso pietismo
pessoal, o nosso moralismo rígido, quando a religião nos impede de reconhecer a
graça de Deus dentro da nossa casa, melhor seria que tivéssemos dissipado tudo
na terra distante, como fez o mais novo. Penso que foi isso que Lutero quis
dizer naquele seu estranho ditado: Peque
ousadamente, já que você será um pecador hoje. Pise firme no hoje, vivendo na
certeza da graça de Deus.
Nós os irmãos mais velhos, nós somos as irmãs mais velhas que
temos deixado o pai sem sair de casa. Mas como podemos saber que isso acontece
de fato? Existe uma prova para nos avaliar, alguém quer saber qual? Basta
simplesmente que verifiquemos as nossas atitudes para com aqueles que tem
falhado na vida. Vamos verificar as nossas atitudes para com aqueles que estão
tão perdidos que pecam em tudo que fazem. Vamos verificar as nossas atitudes
para com aqueles cuja conduta nós desaprovamos e até detestamos. Uma das
maneiras mais contundentes de sentir o impacto total do que Jesus quis nos
contar com essa parábola é imaginar o que teria acontecido se o filho perdido
que estava na terra distante, que acordou no esterco e que declarou sua
confissão de pecados tão humildemente, tivesse encontrado o irmão mais velho,
ainda no campo, antes que ele encontrasse o abraço acolhedor e amoroso do pai.
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