Rupturas com o Judaísmo - Parte IV

 


Proselitismo e discipulado

Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque rodeais o mar e a terra para fazer um prosélito; e, uma vez feito, o tornais filho do inferno duas vezes mais do que vós! Mateus 23:15

 

Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século. Mateus 28.19-20

 

Desde o seu nascedouro a igreja tem convivido com o desafio da sua expansão pelo mundo. Tanto os mais geniais quanto os mais absurdos meios de evangelização foram empregados ao longo de dois mil anos da história de igreja. Porém, a ideia de atrair pessoas para o seu credo não foi exclusividade do Cristianismo. Muitas religiões mais antigas e mais influentes em seu tempo utilizaram artifícios para angariar adeptos. Até o Judaísmo, que nascera para ser uma religião exclusiva dos descendentes sanguíneos de Abraão, por razões de sobrevivência, viu-se na condição de ter que converter pessoas oriundas de outras religiões, principalmente as que eram simpáticas à sua fé, assim como aconteceu com Raabe e Rute. Dessa disposição surgiu a figura do prosélito, aquele que professava o judaísmo, mas não é descendente de judeus nativos.

 

O proselitismo judaico tratava exclusivamente de fazer com que os novos seguidores da religião se enxergassem como eles se enxergam: um povo exclusivo de Deus de um Deus exclusivo, chegando à conclusão de reconhecer-se como “a menina dos olhos desse Deus”. A despeito da diligente pregação profética ter se empenhado ao extremo em convencer a Israel assumir o seu verdadeiro papel na história da salvação: Ser o canal da bênção de Deus para todas as nações.

 

Hoje o proselitismo encontrou outras vias. Tem servido para que pessoas mal intencionadas se empenhem em agenciar partidários à su causa, doutrina, ideologia ou religião, execrando qualquer outro que não pense, aja ou creia como elas. O propósito obstinado do proselitismo é fazer prosélitos, mesmo que não haja da parte do outro interesse algum para esta conversão. O proselitismo é conhecido por se valer de técnicas de persuasão antiéticas e muitas delas agressivas.

 

Jesus condenou com veemência esta prática, uma vez que, por meios inescrupulosos, visava motivar as pessoas a potencializarem mais ainda as suas doutrinas. Doutrinas essas que contrariavam os princípios mais elementares do Reino que veio inaugurar. Em contraproposta ao proselitismo Jesus enfatiza o discipulado, a arte de fazer discípulos. Proposição que exclui os discipuladores de qualquer possibilidade de se sentirem privilegiados, de projetarem-se como modelos, de propagarem a própria imagem ou de incutir conceitos concebidos por eles mesmos. O foco deverá ser exclusivamente aquele proposto por João Batista: Importa que ele cresça e eu diminua. Talvez seja essa a diferença fundamental entre proselitismo e discipulado.

 

Entretanto, existem outras diferenças. No proselitismo judaico existia uma cadeia hierárquica rigidamente fundamentada na antiguidade, no conhecimento e no prestígio que um membro possuía sobre os demais. Esta cadeia se estendia do sumo sacerdote ao mais insignificante membro da comunidade. Conceito de tributava aos mais elevados, poderes extremos e determinações inquestionáveis. Esse foi outro conceito contra o qual Jesus foi inflexível: Vós, porém, não sereis chamados mestres, porque um só é vosso Mestre, e vós todos sois irmãos. Mas o maior dentre vós será vosso servo. Mateus 23:8-11 Contra a hierarquia do proselitismo Jesus propõe a “hierodulia”, palavra derivada do grego doulos, que significa servo, ou seja, a inversão total de qualquer tipo de hierarquia.

 

Um terceiro aspecto dessa ruptura se mostra no que diz respeito à formação do indivíduo. Uma vez que o proselitismo tinha por finalidade formar consciências convictas de uma verdade absoluta, quando considerado apto o prosélito era lançado à sua própria sorte para que dela tirasse o máximo proveito. Já no discipulado o aprendizado é permanente e não visa o próprio benefício: De graça recebeste, de graça dai.  Mateus 10.8 Na fé cristã não existe possibilidade alguma do discípulo considerar-se plenamente capacitado. Uma vez discípulo, discípulo por toda vida. Sendo fiel a esse princípio, o cristão se torna herdeiro da mais encorajadora e serena das promessas de Jesus: E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do século. Mateus 28.20 (Continua) (Anterior)

 

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