Texto do rev. Luiz Carlos Ramos.
Joel significa “Javé é Deus” (cf. 2.7,24 e 4.17) e sua
preocupação final, como profeta, tem relação com a precariedade da vida imposta
à sociedade do seu tempo e sua relação com esse Deus. No tempo do profeta,
por volta do século IV a. C., o povo de Deus vivia sob o imperialismo
pós-exílico. Ciro, o rei persa, triunfa sobre a Babilônia, que
havia deportado os judeus, e atende ao clamor da comunidade de Judá,
permitindo o retorno dos exilados (538 a. C.), e permite ainda que sejam
devolvidos os utensílios do Templo de Jerusalém, que havia sido espoliado. Mas
isso não implicou em muitas vantagens para o povo.
Por essa época, Joel, o profeta, faz uma viagem de
reconhecimento pelo seu país. O que o profeta encontrou em seu itinerário está
relatado no primeiro capítulo do seu livro: videiras secas (1.7); campos
assolados, cereal destruído e olivais murchos (v. 10); colheitas de trigo e
cevada perdidas (v. 11); árvores frutíferas secas (v. 12); sementes secas,
silos roubados, armazéns demolidos (v. 17); gado gemendo, bois e ovelhas
padecendo por falta de pasto (v. 18); pastagens consumidas pelo fogo (v.19);
rios secos e estepes devoradas pelo fogo (v. 20).
A palavra que melhor define a situação do povo
é precariedade: escassez de recursos, instabilidade econômica e
psicológica, debilidade física e moral, etc. Isso tanto em sentido individual
como comunitário. Tudo porque, submetido a um rei e a leis estrangeiras, o povo
de Deus se descobre como pequena etnia num império multirracial sem autonomia
para dirigir seu destino. Mais lamentável, ainda, é o fato de que parte dessa
dominação se dava mediante o sacerdócio de Jerusalém, comprometido com o
império persa.
O povo tem que pagar altas taxas e lhe são cobrados pesados
impostos. Este é só o primeiro estágio de uma crise que se agravaria ainda
mais, pois, pouco a pouco, esse sistema tributarista vai cedendo lugar ao
escravismo. À medida que os recursos escasseiam e que não se pode mais honrar
os compromissos tributários, resta ao povo pagar com trabalho e seus próprios
corpos.
É para essa realidade que Joel dirige a sua profecia. Pois,
pior do que lidar com as crises é tentar fugir delas. Joel desafia o seu povo a
enfrentar essa situação ao apontar para o caminho que leva à ruptura com a
crise e o desespero. O profeta mostra que a calamidade não é ponto final, mas
ponto de partida para a reconquista da dignidade.
São quatro as “ferramentas” apontadas por Joel que devem ser
usadas para confrontar a crise:
A memória dos anciãos, que eram a liderança do povo (1.2-3):
“Ouvi isto, vós, velhos, e escutai, todos os habitantes da terra: Aconteceu
isto em vossos dias? Ou nos dias de vossos pais? Narrai isto a vossos filhos, e
vossos filhos o façam a seus filhos, e os filhos destes, à outra geração.” Joel
apela para aqueles que guardam a lembrança dos acontecimentos importantes da
história do povo, pois são eles os portadores da memória de libertação. A crise
começa a ser superada quando os mais velhos colocam a sua experiência a serviço
da comunidade.
A transformação do coração, isto é, a conversão interior e
profunda que implica numa nova consciência da forma do relacionamento com Deus
e com o próximo. “Ainda assim, agora mesmo, diz o SENHOR: Convertei-vos a mim
de todo o vosso coração; e isso com jejuns, com choro e com pranto. Rasgai o
vosso coração, e não as vossas vestes, e convertei-vos ao SENHOR, vosso Deus,
porque ele é misericordioso, e compassivo, e tardio em irar-se, e grande em
benignidade, e se arrepende do mal” (2.12-13). A superação da crise tem de ser
superada por cada um de corpo e alma, com a emoção e com a inteligência.
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