Por que andas irado?

Caim e Abel, Tintoretto
Afasta de mim o estrépito dos teus cânticos,
porque não ouvirei as melodias de tuas liras.
Antes, corra o juízo como as águas; e a justiça, como ribeiro perene
.

- Amós 5.23-24

Nas últimas postagens, consideramos a pergunta Que fizeste? endereçada a nossos primeiros pais nos primórdios e também a nós, hoje. Essa conversa não ficou sem consequências.

Deus não havia criado o mundo para ser algo estático, parado, como um quadro, simplesmente para ficar olhando para ele. Ao contrário, seu propósito era criar algo dinâmico, produtivo, que gerasse muitos benefícios para suas criaturas e lhes proporcionasse muita alegria. Uma infinidade de coisas boas ainda estava para acontecer.

Se as criaturas às quais Deus entregara a terra para dominar, cultivar e cuidar tivessem se servido com sabedoria da liberdade de escolha com a qual as havia agraciado, talvez a vontade divina continuasse sendo feita, assim na terra como no céu. Entretanto, mediante a escolha inadequada que elas fizeram, o criador teve que tomar algumas providências para manter-se fiel a seus propósitos.

Assim, de imediato, estabeleceu inimizade entre a serpente e a descendência da mulher, isto é, o homem, determinando que este lhe ferisse a cabeça. A presença da serpente nessa história deixa claro que o mal não está no ser humano, por isso, ele mesmo suplantaria a sagacidade dela, lhe ferirá a cabeça, e afastaria o mal do mundo. Nesse meio tempo, o homem continuaria retirando da terra o seu sustento, e a mulher, procriando, mas a duras penas. Parte da população seria governada pela outra parte, e o desejo daquela seria para esta; como então contavam-se apenas dois seres humanos, a mulher sofreu o destino da governada e Adão, o da governante.

Obedecendo este novo ordenamento, a vida continuou. Adão e Eva coabitaram gerando dois filhos, Caim e depois, Abel. Como a nova ordem estabelecia que, para se alimentarem, teriam de produzir seu alimento com o suor do rosto, o mais novo se dedicou ao pastoreio e o mais velho, à agricultura. O convívio entre os homens começava e se tornar mais complexo, com as atividades produtivas se especializando. Surgiu um novo problema: que fazer com o produto do trabalho, depois de saciar a própria fome? Caim trouxe do fruto da terra uma oferta ao Senhor. Abel, por sua vez, trouxe das primícias de seu rebanho. Agradou-se o Senhor de Abel e de sua oferta; ao passo que de Caim e de sua oferta não se agradou.

É pensamento geral que toda oferta feita a Deus é válida, que todo culto, toda adoração, todo louvor é agradável a ele. Mas ele não gostou da oferta de Caim. Nem das mais esplêndidas celebrações jamais oferecidas no templo de Jerusalém em toda a história de Israel antigo. A respeito delas, disse ele: Aborreço, desprezo as vossas festas e com as vossas assembleias solenes não tenho nenhum prazer...

A sós com Deus, você certamente reconhecerá também que, em muitas ocasiões, não sentiu que suas atitudes especificamente religiosas tenham sido acolhidas por ele. Em alguns casos, você deve ter agido tão automaticamente, que nem se preocupou com o assunto. Assumindo esse fato, é natural que você fique aborrecido, principalmente quando observa que outros irmãos são mais bem sucedidos. Caim, por exemplo, irou-se sobremaneira. Os não religiosos também costumam se aborrecer quando semelhantes seus obtêm melhores resultados em seus empreendimentos, denunciando igualmente que alguma coisa está errada.

Uma situação nova, um novo problema. E Deus, fiel a seu método dialético, continuou dedicando-se a instruir e preparar o homem para se sobrepor à serpente, ao mal. Com esse intuito, a pergunta que fez a Caim aplica-se também a nós, a mim e a você: Por que andas irado? O que o/a perturba?

Existe grande semelhança entre este episódio e a parábola do filho pródigo, por isso, na próxima postagem, vamos confrontar Os dois irmãos.

Referências bíblicas:
Gênesis 3.15-16; 4.1-7; Amós 5.21-24.

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