Funeral de JFK |
Mais um feriado de finados se passou sem que questões
fundamentais sobre esta celebração tenha sido devidamente discutida. As
denominações se fazem cegas diante de problemas dessa natureza, e guardam para
si os motivos que as levam a celebrar e não a celebrar essa data. De um lado
ficam os protestantes achando que os católicos exageram a importância da
celebração. Do outro ficam os católicos no direito de acharem que os protestantes
não prestam o devido respeito aos que se foram. No meio ficam aqueles que, como
eu, ainda não possuem uma opinião definida.
Afinal, quem morreu, morreu, e a morte pôs fim a toda uma
trajetória de bênçãos e sucessos, e de pecados e percalços, ou ainda deixaram
para trás um sulco que, de uma forma ou de outra, interferem na trajetória dos
que ficam?
Há um tempo atrás os protestantes, mesmo os mais
pentecostais, não se permitiam qualquer ponderação que não fosse contrária a
esta celebração, posto que ela é predominantemente católica. Isso no Brasil, porque
em outros países ela é muito bem observada pelas igrejas Ortodoxa e Anglicana.
No entanto, através das doutrinas neopentecostais, a preocupação com os mortos
tomou um rumo diferente. A doutrina conhecida como Maldição Hereditária fez com
que esse assunto entrasse na pauta das igrejas, mas pela porta dos fundos. Ou
seja, os mortos não são mais uma lembrança que trás à tona as melhores recordações,
mas se tornaram os únicos culpados pelas adversidades que atravessamos nos dias
de hoje, quer voluntária, quer involuntariamente.
Posso entender que os calvinistas tenham uma herança
negativa com relação ao trato com os mortos. Calvino, o grande mentor dessa tradição
cristã foi uma criança muito atormentada pela mãe, que o obrigava a beijar a
mão ressequida de um santo morto. Se é que este fato tenha realmente influência
na tradição desta denominação em particular. Mas os metodistas não têm esse
direito. John Wesley, quando teve os púlpitos da Igreja Anglicana fechados para
ele, iniciou um movimento de renovação pregando de cima na tumba de seu pai. Mais
estreita do que em qualquer outra igreja, inclusive a Católica, o Metodismo a
sua relação com os mortos.
Não foi somente impactante a atitude de Wesley, foi também
significativa. Pode muito bem ser que dentro de um templo e de cima de um
púlpito ele não tivesse enxergado a sua verdadeira vocação. Mas com certeza foi
o eco do instante em que o único lugar que lhe restou fosse exatamente o lugar
em que a morte propiciou a comunicação da vida, e onde ele pôde gritar a plenos
pulmões: O mundo é a minha paróquia.
O mundo é a minha paróquia e o mundo é composto por pessoas
que celebram os mortos e por pessoas que não celebram. Pior ainda. É composto por
aqueles que um dia celebraram, e que agora, por força de uma mudança de
pensamento em outros aspectos da vida, se veem forçados pelas suas igrejas a
negarem uma tradição da qual tinham orgulho e alegria em participar.
Afinal, um evangélico pode ou não homenagear os seus mortos? Essa é a questão secundária. Imaginem vocês como anda a consciência daqueles que não puderam
cumprir com o seu ritual anual de visitação ao túmulo de um ente, cuja
lembrança evoca os melhores sentimentos. Imaginem também o remorso que eles
carregam pelo descumprimento de um pacto assinado com lágrimas no leito de
morte com a pessoa que foi, e ainda é muito amada.
Homenagear ou não os mortos não faz ninguém mais ou menos
cristão, mas com certeza, a intromissão indevida de uma doutrina mal enjambrada
pesará grandemente na consciência daquele que ainda não tem uma posição bem
definida sobre esse assunto. E isso sim, não é nada cristão.
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