Tende em vós o
mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, pois ele, subsistindo em
forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes, a si mesmo
se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens; e,
reconhecido em figura humana.
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Jean-Paul Sartre, segundo Russ Cook |
Jean-Paul Sartre dizia que o verdadeiro pensamento é aquele
que pensa contra si mesmo. Mas parece que este não é um bom ponto de partida
para quando está em questão o evangelho de Jesus Cristo. Não que esse evangelho
tente evitar que estejamos constantemente avaliando nossas atitudes e
consciência, mas sim porque ele nos alerta para não sermos mais realistas do que
o rei, e mais religiosos do que Deus. Ou seja: pense, mas não tanto. Como diz o italiano: ma non troppo.
Jesus disse textualmente que julgamento de Deus é mais leve que
o nosso, e que a penalidade dele, que foi traduzida por fardo, é ainda mais
suave que a nossa. João, o evangelista, em sua primeira carta é muito mais
explicito quando profetizou em nome de Deus: Se o teu coração te condena, Deus é maior que o teu coração e conhece todas
as coisas.
Aqui estamos nós diante de um impasse: o rigor de uma
conduta que exige que a nossa justiça prevaleça sobre a irretocável justiça dos
fariseus; que sejamos fermento em meio à massa; que marquemos presença tal como
faz o sal nos alimentos; que brilhemos como a luz do céu; e a misericórdia de
um Deus que não encontra limites nem mesmo naquilo que nós mesmos mais odiamos
em nós mesmos e mais condenamos nos outros. Parece mais um carro andando com o freio
de mão puxado: faz força, mas não acelera. Mas não é não.
O que temos aqui é sinaliza a necessidade de constante vigilância
para que não somente preguemos o evangelho verdadeiro, mas para que também
vivamos estritamente segundo as suas verdades. E o que isso quer dizer?
Primeiro a certeza de que vivemos debaixo do perdão de Deus que
nos pega de surpresa porque vem antes de qualquer sinal do nosso próprio arrependimento.
Esse é um convite aberto à iniciativa sem medo de errar. Conheci um velho
pastor que dizia: minha maior preocupação
com Dia do Juízo não é com as enormes idiotices que fiz ao longo da minha vida,
e sim com todas as que deixei de fazer por medo de estar errado. Agora, depois
de velho, eu vejo o quanto deixei o medo falar mais alto que o evangelho.
A segunda certeza é de que a nossa salvação não depende em
absolutamente nada da nossa eficiência. Ela jamais acontecerá pelo que fazemos
ou deixamos de fazer, mas sim pelo que Jesus fez por nós na cruz do Calvário. Isso
vale também para as outras pessoas, principalmente aquelas pelas quais Cristo
morreu. Isto é, todas as pessoas.
Colocaria como uma terceira certeza os exemplos que a Bíblia
nos fazem conhecer. Um filho pródigo que nada fez para ser tão amado quanto foi;
uma prostituta que encontra mais perdão do que ela mesma pode suportar; que faz
uma adúltera que cala e põe em debandada os seus acusadores; que faz com que um
assassino confesso venha a se tornar a voz atuante e lúcida em toda a história
da Igreja.
Acima disso tudo eu invoco a palavra de um dos mais severos
e incomplacentes guardiões da moral e dos costumes cristãos, que foi Santo
Agostinho. É justamente dele que vem a palavra definitiva contra o nosso
julgamento implacável, seja conosco ou com o próximo. Ele disse tão somente: não se desespere, pois um dos ladrões foi
salvo; não presuma, pois que o outro ladrão foi condenado.
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