O ide, autor não identificado |
O que para muitos é a semana decisiva, no que diz respeito à
consolidação dos conceitos doutrinários da fé cristã, para outros ainda permanece
um inominável enigma. Porém, tanto estes quanto aqueles não têm motivo algum
para não considerar os acontecimentos desse período como cruciais para a compreensão
daquilo que foi dado à Igreja no princípio e que até hoje permanece como suas
duas grandes e insubstituíveis comissões:
Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do
Pai, e do Filho, e do Espírito Santo, e a outra muito semelhante a essa: recebereis poder, ao descer sobre vós o
Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a
Judeia e Samaria e até aos confins da terra.
Um olhar atento através desse prisma consensual pode fazer crer
que os próprios evangelistas relataram com convicção plena a sua visão clara desses
fatos e que, dessa forma, transmitiram à posteridade a certeza de que eles realmente compreenderam o que eles deveriam significar para a nossa fé, mas não é bem assim. Após ter passado quarenta, cinquenta, sessenta anos, mais ou menos o período em que os evangelhos foram escritos, nota-se que tanto as
visões quanto as considerações não são tão consensuais quanto parecem.
Mateus 28.17 nos mostra o quanto poderiam ser oscilantes as
visões e considerações dos discípulos que as testemunharam, como também apresenta todo o dualismo da situação: Seguiram os onze discípulos para a Galileia, para o monte que Jesus
lhes designara. E, quando o viram, o adoraram; mas alguns duvidaram. Esse
breve relato trata apenas e exclusivamente dos onze escolhidos a dedo,
dos mais íntimos e dos que despenderam mais tempo e mais paciência de Jesus
no aprendizado dos revolucionários conceitos do Reino que ele veio anunciar.
Uns adoraram, outros duvidaram. Jesus sabia bem que ia
encontrar naquele monte um grupo pequeno e dividido, para, a partir dele, dar
continuidade ao plano do seu Pai, e que lhe custou o próprio sangue. Quando
leio inserções como essa nos textos bíblicos mais complexos, fico surpreso com
a quantidade enorme de alternativas que a Bíblia nos abre para a compreensão
desse nosso Deus; com o quanto esse Deus é maleável nas suas revelações; como é
enorme leque possibilidades que ele nos abre para encontrá-lo. Pensemos de
outro modo só por um segundo: Caso Jesus, em vez de um grupo inexpressivo e
confuso, tivesse encontrado naquele monte uma igreja com as nossas de hoje, cheias
de pessoas, e de pessoas cheias de convicção, o que ele faria? Nada! No mínimo
iria imaginar que estava no monte errado.
O que me deixa mais perplexo ainda é o quanto nós nos
julgamos melhores do que aqueles onze perdidos na Galileia; do quanto nos
julgamos mais santos do que todos aqueles que crucificaram Jesus; do quanto
somos mais conscientes do que Judas que o entregou. Para expor de vez toda essa
confusão consciente que adquirimos ao longo de nossas vidas, eu queria pedir
licença à paciência de vocês, e utilizar essa semana para fazermos uma
reflexão, mais profunda quanto possível sobre essa sequência de fatos e
também sobre o que cada um dos evangelistas extraiu deles.
Parece que eu já comecei a fazer isso no último domingo e
que continuei fazendo nos dois dias que se seguiram sem pedir permissão alguma.
Mas agora, devido à abrangência do assunto, a intenção é de contar com a
colaboração de vocês através de contestações e opiniões. Todas serão muito bem
vindas e consideradas. A proposta é de avaliarmos a posição que nos encontramos
entre a Ascensão e o Pentecostes. Dentro desse intervalo de tempo que mudou
radicalmente a vida da igreja, e, consequentemente, a vida de cada cristão em
todos os tempos e lugares.
Falamos da Ascensão do Senhor nesses quatro últimos dias,
segundo o relato de Lucas. Contudo, não entramos, e isso foi proposital, na
discussão quanto ao modo que ela aconteceu. Ficamos divagando sobre as atitudes
dos discípulos diante do aviso de despedida que Jesus lhes dera. Mas não
falamos que o mesmo Lucas, no relato que faz no Livro dos Atos dos Apóstolos,
se não modifica o panorama, faz um complemento bastante divergente da sua
primeira citação no evangelho que leva o seu nome.(continua)
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