A casca de Charon, Luca Giordano |
Quando voltamos a nossa atenção para o método de escolha do
Canon bíblico, ou quando vamos além: quando atentamos para os critérios que
escolheram os textos que compõem cada um dos seus livros nos deparamos com
surpresas realmente instigantes. Tomemos o Salmo 49 como exemplo, o quanto os
seus versos ele se assemelham às indagações levantadas pelos Provérbios e o quanto
a sua mensagem é tão inquietante quanto à aridez embutida nas palavras do
Eclesiastes. Ele não parece ser exatamente um salmo, pelo menos não o seria o
mais recomendável para suprir a expectativa de ir ao encontro das nossas
angústias e aflições. Curiosamente ele parece querer aumentá-las ainda mais.
Em um detalhe interessante que parece ter escapado da percepção da maioria dos tradutores que no texto em português optaram por usar a palavra parábola em vez da palavra provérbio, pois é nesse detalhe que o próprio salmista declara que a sua intenção era confundir, e não esclarecer, como ele apregoa: Vou dar atenção aos provérbios e, enquanto toco a minha lira, vou explicá-los. Ele confessa que pegou intencionalmente a sua lira, que era o instrumento usado para cantar um salmo, mas que ia por meio dela explicar o provérbio que apresentaria a seguir.
Em um detalhe interessante que parece ter escapado da percepção da maioria dos tradutores que no texto em português optaram por usar a palavra parábola em vez da palavra provérbio, pois é nesse detalhe que o próprio salmista declara que a sua intenção era confundir, e não esclarecer, como ele apregoa: Vou dar atenção aos provérbios e, enquanto toco a minha lira, vou explicá-los. Ele confessa que pegou intencionalmente a sua lira, que era o instrumento usado para cantar um salmo, mas que ia por meio dela explicar o provérbio que apresentaria a seguir.
É sabido que tanto a escolha dos textos quanto à disposição
deles na Bíblia guardaram uma distância considerável de tempo da época em que
foram escritos, o que torna a sabedoria dos antigos quase tão remota para esses escritores,
quanto para nós hoje. Pelo menos nisso estamos em pé de igualdade com os massoretas,
que foram os fiéis compiladores do texto que temos hoje, pois frequentemente
nos flagramos com a mesma perplexidade que eles tiveram, diante da riqueza da
contribuição daqueles que levaram a Palavra de Deus a sério e a deixaram incólume para a
humanidade.
Deixem-me fazer uma pergunta: qual seria a razão da nossa
perplexidade diante dessa possível confusão que fez o salmista? Não seria a
hipocrisia dos nossos critéris um dado que o salmista não daria a menor atenção?
Temos critérios absurdamente idiotas no nosso cotidiano. É expressamente
proibido se falar em morte para alguém doente. Um pastor que usa a palavra
separação em uma cerimônia de casamento está sumariamente condenado ao inferno.
Isso para não entrar no politicamente correto que é uma idiotice maior ainda.
Se me fosse dado o privilégio de descrever o contexto desse
salmo, eu diria que ele se passa em uma festa opulenta em que tanto os
anfitriões quantos os convidados estavam se refestelando sem que houvesse
amanhã. Para mim seria esse o ambiente ideal para que o profeta lírico de Deus
lançasse a sua mensagem inquietante e desafiadora. Para que o arauto do
Altíssimo denunciasse a injustiça social, e ao mesmo tempo prevendo as
vicissitudes do vazio para onde essa injustiça estava os estava arrastando
implacavelmente.
Definitivamente era esse a diferença entre os pregadores
antigos e nós, os de hoje. Para eles não havia um ambiente que não fosse suscetível
a uma intervenção divina, mesmo que as circunstâncias se apresentassem contrárias.
Era exatamente isso que o grande John Wesley exigia dos seus pregadores: Pregue expressamente em favor da
educação. Com dom ou sem dom tens que fazê-lo; de outra forma não
estás chamado a ser um ministro de evangelho.
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