A psyché homenageada pelo povo, Luca Giordano |
O nefesh manifestava desejos que iam além das necessidades básicas da pessoa, tais como acúmulo de bens, relacionamentos e sentimentos. O nefesh estaria para o homem na mesma relação que o rûah (Espírito) estaria para Deus. Mas esta relação não encontra respaldo em muitos estudiosos, posto que estes relacionam o nefesh à vida vegetativa, coisa que Deus não possui, e a rûah à vida espiritual. Numa concepção que pode causar grande estranheza entre nós hoje, os antigos imaginavam que o nefesh poderia subsistir fora do corpo do homem após a sua morte, e até mesmo ir parar nos infernos, podendo ser de lá tirada somente por uma manifestação da graça de Deus. Como poderíamos imaginar uma garganta viva fora do corpo? Deve ser daí que vem a antiga tradição de se dar o nome de alma aos habitantes do mundo dos mortos. Antiga, porém, em desacordo total com a Bíblia, porque para ela nefesh mêt não significa a alma de um homem morto, e sim homem morto. Os antigos israelitas acreditavam que o nefesh não morria, apenas diminuía as suas atividades, e que nesse processo, o nefesh ia ao encontro dos seus ancestrais, crença que deu origem à tradição de que o morto seja sepultado no túmulo da família. Como o Primeiro Testamento não faz qualquer alusão à pré existência da alma, devemos concluir que eles concebiam que esta nascia com o indivíduo, no entanto, se era gerada pelos pais na concepção, como pensam os protestantes, ou se era dada por Deus, que possui um estoque ilimitado de almas, no nascimento, como afirmam os teólogos católicos, é uma questão que estas tradições cristãs ainda vão discutir muito entre si.
O Segundo Testamento não acrescenta muita coisa ao sentido original. A palavra grega psyché possui profundas semelhanças com o nefesh, daí a sua tradução na Bíblia ser também alma. Num sentido mais requintado pode significar também mente ou pensamento, mas o que é interessante, é como esta mesma palavra pode ter dois significados na boca de Jesus. Uma hora ele diz: Quem quiser achar a sua “psyché”, perdê-la-á (significando vida), mas no mesmo contexto da afirmação anterior ele diz também: De que vale o homem ganhar o mundo todo e perder a sua “psyché” (significando alma).
Mas o Segundo Testamento faz algo impensável ao Primeiro. Por várias vezes coloca a psyché em oposição ao corpo. Quando o homem antigo pecava, o seu corpo e a sua alma estavam inteiramente comprometidos com o pecado. Tanto alma quanto corpo concorriam para este fim. Somente a partir da influência grega no Segundo Testamento que os pensadores cristãos passaram a se esforçar para manter a psyché, que era boa, distante e isolada do soma (corpo) que era mau. Era essa relação de sujeição ou não à vontade do corpo carnal é que iria determinar se receberia prêmios ou castigos na vida vindoura. Em um voo mais estratosférico, alguns pensadores, como Paulo e o autor da Carta ao Hebreus, acrescentam ainda um outro elemento à natureza humana, o seu espírito. Mas este será assunto de uma próxima reflexão.
Apesar de tudo que se disse, apesar dos gregos e dos hebraicos, acho que a complexidade da alma exige uma definição simples, simples como a definição dada por Mário Quintana. Alma é essa coisa que está sempre nos perguntando se a alma existe.
Apesar de tudo que se disse, apesar dos gregos e dos hebraicos, acho que a complexidade da alma exige uma definição simples, simples como a definição dada por Mário Quintana. Alma é essa coisa que está sempre nos perguntando se a alma existe.
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