Paradigmas da fé

Isaque abençoando Jacó, Govert Flinck (1615-1660)
Em uma das primeiras meditações deste blog foi feita uma exposição de argumentos em favor da tese que tenta provar que a fé é exclusividade do Judaísmo e do Cristianismo no post cujo título é “Fé: Condição e Exclusividade”. Embora exclusiva, podemos observar que fé não possui conceitos monolíticos nem em uma e nem em outra religião. Em nenhum dos dois credos podemos dizer com convicção que a fé é fé e assunto encerrado. Existem formas de se posicionar, de agir e de pensar que são bastante distintas proporcionando a sensação que estamos diante de divisões tão herméticas que beiram a incompatibilidade entre ambas. Chamo a atenção de vocês para estes dois paradigmas da fé que são tão presentes hoje quanto no período bíblico.

O primeiro e mais antigo deles é aquele que poderíamos chamar de “fé por causa de”. O tipo de fé que está bem representado no voto de compromisso firmado por Jacó, quando este fazia uma temerosa jornada por um terreno, que segundo ele mesmo era aterrorizador, fugindo da perseguição de seu irmão Esaú, a quem anteriormente havia fraudado no direito de primogenitura. Fez também Jacó um voto, dizendo: “Se Deus for comigo, e me guardar nesta jornada que empreendo, e me der pão para comer e roupa que me vista, de maneira que eu volte em paz para a casa de meu pai, então, o SENHOR será o meu Deus; e a pedra, que erigi por coluna, será a Casa de Deus; e, de tudo quanto me concederes, certamente eu te darei o dízimo”. 

É importante que se observe a riqueza de elementos que compõe a narrativa: a fuga apressada, a terra estranha, o sonho da escada, a construção do altar, todos eles colaborando decisivamente para o pacto de proteção que seria compensado através do sacrifício que seria proposto em seguida. Talvez a palavra sacrifício não esteja aqui bem empregada pelo fato de representar uma resposta do homem a uma iniciativa de Deus. Normalmente os sacrifícios concorrem no sentido oposto. Isto é, são respostas de Deus às iniciativas do homem. Até isso depõe contra a ideia vigente de dízimo. O sacrifício vem sempre antes, o dízimo somente depois. Mas não é sobre dízimo a nossa meditação.



Se fizermos uma abordagem honesta da “fé por causa de” fatalmente iremos concluir que esta nada mais é do que a instituição declarada e definitiva da doutrina da retribuição, do toma lá dá cá, do se fizer eu também faço. Doutrina que de imediato esbarra em questões primárias, tais como: Para que Deus precisa do nosso dinheiro? Para não cair na tentação de expor a minha visão unilateral, vou deixar que a Bíblia responda por mim: Não te repreendo pelos teus sacrifícios, nem pelos teus holocaustos continuamente perante mim. De tua casa não aceitarei novilhos, nem bodes, dos teus apriscos. Pois são meus todos os animais do bosque e as alimárias aos milhares sobre as montanhas. Conheço todas as aves dos montes, e são meus todos os animais que pululam no campo. Se eu tivesse fome, não to diria, pois o mundo é meu e quanto nele se contém. Acaso, como eu carne de touros? Ou bebo sangue de cabritos? Oferece a Deus sacrifício de ações de graças e cumpre os teus votos para com o Altíssimo; invoca-me no dia da angústia; eu te livrarei, e tu me glorificarás (Sl 50,8-15).




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