Conhecimento, que falta faz (final)

Cortejo de Baco e Ariadne, Luca Giordano (1632-1705)

O segundo problema que a falta de conhecimento causa é o erro de julgamento. Segundo o ato, este sim profético, Oséias diz que no país em que prevalece roubo, adultério, mentira e homicídios em cima de homicídios, toda estrutura religiosa está comprometida, porque lhe falta o compromisso com a verdade e com o amor, ocasionado pela falta de conhecimento de Deus. Da profecia de Oséias ninguém escapou, nem o povo, porque era exatamente igual aos seus dirigentes a quem acusava, e nem os que deveriam ser a voz da indignação, porque estes viviam tropeçando nos próprios erros.

Para antecipar o resultado deste estado de coisas não é preciso ser profeta. Era mais do que certo que a mãe pátria seria destruída. Da mesma forma que não nos falta hoje os sinais de uma destruição iminente que se aproxima a passos largos. São os Big Brothers, orações de gratidão por propina, comércio desenfreado de toalhinhas, martelinhos e outros fetiches no templo, idolatração de pastores, cantores e prognosticadores. O país tropeça de dia e a igreja tropeça de noite.

Se nós em nossas igrejas tanto nos orgulhamos de ostentar os nomes de Raça Eleita, Nação Santa e Sacerdócio Real, está mais do que na hora de agirmos como tal. Mas não é o que está acontecendo. Parece que há entre nós uma alegria consensual com a proliferação do mal. Parece que o aumento do mal é bom. Subvertemos Rm 5.20. Agora, onde aumenta o mal, não é mais a graça que aumenta mais ainda e sim a nossa alegria e esperança.

Supondo, confiados em uma teologia nem um pouco bíblica, que Jesus virá amanhã ou no máximo no mês que vem, estamos apostando tudo o que somos, tudo o que temos e toda uma riquíssima tradição de fé no caos, que representaria a redenção da igreja e o seu consequente arrebatamento. Para que vocês querem a volta de Jesus, será um dia de trevas e não de luz. Será como um homem que foge de um urso e se depara com um leão, diria Amós, o verdadeiro dono desse blog, se fosse vivesse os nossos dias.

Oséias bateu com toda a sua força nesta tecla. Ele profetizou a Palavra de Deus para que todos ouvissem: Se vocês querem se enganar, se querem insistir em continuar se prostituindo, tudo bem, mas depois não venham com juras e orações de louvor a mim. Como vão querer que eu apascente uma vaca brava numa terra tão vasta como que apascenta um cordeirinho?  

Mas ainda consegui detectar um terceiro problema ocasionado pela falta do conhecimento: buscar encontrar Deus em coisas, pessoas ou lugares e não dentro de nós mesmos. Mais do que em qualquer tempo antes do nosso, o povo tem procurado aproximar-se de Deus através de peregrinações, subidas a montes íngremes, aquisição de artefatos sagrados do judaísmo etc. Nem durante as Cruzadas o mundo enviou um contingente tão grande à Palestina, ou Terra Santa, como queiram. Parece que Deus não mais vem a nós através da oração silenciosa e oculta, então, resolvemos por conta própria ir até ele. As pessoas no tempo de Amós buscavam a Deus através de sacrifícios nos montes, queimavam incenso nos outeiros, debaixo de carvalhos e não o encontravam. Inconformados com esta estranha ausência, começaram a imitar as práticas dos cultos pagãos, passaram a procurá-lo através da prostituição, da sensualidade, do álcool e de manifestações de êxtase que praticamente aniquilam qualquer possibilidade de conhecimento.

Diferentemente do legalismo atual e do conceito equivocado de Templo do Espírito Santo, a bebedeira é condenada na Bíblia por uma única razão: ela perverte o juízo e o direito. Não é próprio dos que tem poder de decisão beber vinho nem outras bebidas alcoólicas. Quando eles bebem, não se lembram das leis e esquecem do direito dos que são explorados (Pv 31.4-5). Dizia Angelos Silésius, um místico do século XVII: Ainda que Cristo nascesse mil vezes em Belém, enquanto não nascer dentro de ti, a tua alma continuará extraviada: olharás em vão a cruz do Gólgota, enquanto ela não se erguer em teu coração também.

Não sei se é apropriada, mas queria terminar essa meditação com um pequeno trecho da vida de Isaura e José Duarte, que por acaso eram meus avós, por isso a conto entre lágrimas. 

José e Isaura foram convertidos por um tamanco, mas essa história eu contarei outro dia. Assim que se converteram na Igreja Metodista, foram informados que não poderiam mais trabalhar aos domingos. Menos mal, se eles não fossem verdureiros e sendo o domingo o dia em que mais vendiam. Convertidos de fato, não se negaram a cumprir esse absurdo legalismo, uma vez que não somente receberam a bênção da salvação, mas também aceitaram os encargos a ela inerentes. Nem precisamos perder tempo descrevendo o quanto a renda familiar despencou. Mas Deus falou mais alto que a idiotice humana. Em muito pouco tempo os seus clientes passaram a comprar as verduras do domingo na véspera, e a situação normalizou-se novamente.

Com certeza Deus operou mais este milagre na vida deles, mas não esse tipo de milagre que todos esperam que aconteça hoje em dia, que espera que Deus corrompa a consciência dos consumidores ou que sensibilize corações dos clientes pela necessidade dos meus avós. Deus não os humilhou fazendo-os rastejar por esmolas. O milagre concretizou-se pela sua honestidade irrestrita, que não os permitiu suprimir algumas folhas de seus molhos de alface, no caráter incorruptível que não consentia que qualquer folha de couve servisse para venda, não importando a sua qualidade. As pessoas não se renderam à penúria deles, mas sim a alta qualidade do seu produto e presteza dos seus serviços. Não aconteceu o esperado milagre da superação das forças da natureza, mas sim o da simples constatação do óbvio.

Que fique registrado que apenas um pouco do conhecimento de Deus não somente reverteu uma circunstância adversa em um dado momento, como também transformou definitivamente a vida das cinco gerações que se seguiram a eles. 

Nenhum comentário:

ads 728x90 B
Tecnologia do Blogger.