Farinha pouca, meu pirão primeiro

Voto de sacrifício

Segundo o compositor brasileiro Bezerra da Silva, esse é um velho ditado do tempo do cativeiro, mas que, para nosso desconsolo, continua atualíssimo, posto que por mais que se veja que por trás dessas palavras ecoa um profundo egoísmo e a notória falta de percepção da necessidade do próximo, uma das respostas apresentadas na enquete do site Yahoo sobre esse assunto foi a que mais se encaixa no estilo de vida proposto pelo que a Bíblia chama de mundo: Não é necessariamente egoísmo, pode ser também visto sob o prisma da prudência, de se antecipar a uma possível escassez, enquanto a cigarra canta, a formiga tá com seu pirão preparado...

Penso que esse seja o enredo que está se desenrolado perante a face da eleição presidencial em nosso país: a minha necessidade diante da situação em que se encontra o país deve vir em primeiro lugar. Vejo isso nas reivindicações que falam dos mais diversos assuntos que afetam grupos particulares e menos naqueles que dizem respeito a todo o conjunto da sociedade, que são emprego, saúde e segurança. É feminismo de um lado, kit gay do outro, armamento da população mais adiante, mas não vejo quase ninguém querendo saber qual é política do seu candidato para as questões que determinam todas as demais. Talvez seja pelo fato de que as inúmeras desilusões que temos sofrido tenham feito com que façamos confusão entre livre arbítrio, determinismo e fatalismo. Ou seja, como já perdemos totalmente o controle sobre os quesitos essenciais, estamos tentando desesperadamente salvar alguns poucos secundários.

Agora, mais do que nunca, precisamos definir em que time vamos jogar e não falo aqui de política partidária, em candidato petralha, coxinha, banqueiro ou machista, mas sim da responsabilidade do voto. Meu voto será a expressão da minha consciência crítica, será servo do determinismo instaurado ou vítima da fatalidade que abreviou o caos? Embora tenha sido chamado de viúva do Lula e classificado por outros adjetivos semelhantemente contraditórios a esse, me situo orgulhosamente no time dos que nem sabem ao certo onde está guardado o título de eleitor. Por tudo isso venho tentar mostrar o que, segundo o meu parco conhecimento do evangelho, seria relevante neste pleito de que se aproxima.

O voto determinista.
Determinismo é a doutrina que ensina que tudo no universo está limitado a leis imutáveis, ou seja, todos os fatos e ações humanas são predeterminadas pela natureza, sendo a "liberdade de escolha" uma mera ilusão da vida.

Curioso é que muitos evangélicos acreditam nisso, porque veem a natureza como uma força idônea, que avassaladoramente joga com o destino das pessoas daqui prá lá e de lá pra cá. Em primeiro lugar o substantivo natureza sequer é cogitado na Bíblia, então não é de lá que deriva essa ideia. Em segundo lugar a Bíblia diz que esse conjunto de leis naturais tem como designação a palavra criação. A criação realizada e consumada por Deus não tem vontade própria, não se rebela ou mostra insatisfação. Ela foi entregue ao homem para que a administre. As Escrituras se valem para tanto do verbo dominar. Dominar encerra o domínio propriamente dito e a denominação, que não é somente dar nome, mas, e principalmente, especificar a sua função. Que uso iremos fazer de tal criatura.

É aqui que se expõe claramente a nulidade do voto determinista. Nada está determinado. Ao ser humano foi dado suficiente capacidade de gerir os recursos naturais. Quem determina as guerras, a fome, as doenças transmissíveis são as pessoas, não o Diabo, Satanás, a natureza ou qualquer coisa que o valha, contudo, quem determina quem vai ter o poder de determinar é o meu e o seu voto.

Esse voto tem outros aspectos interessantes, como o de não votar em um candidato porque ele não tem chance de ganhar. E o termo ganhar é fundamental para que entendamos essa característica de eleitor. Parece que a cédula eleitoral se transforma em um volante de loteria, onde eu vou apostar em quem vai ganhar e a minha consciência crítica que se dane, afinal: farinha pouca meu pirão primeiro. (continua)

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