Caem do céu, mas não na urna |
Por definição fatalismo e determinismo podem ter entre si muitas
semelhanças, porém o determinismo se fundamenta nas causas que se situam na
esfera do humano, já o fatalismo orbita em uma esfera superior, pois, como diria
Nelson Rodrigues, está instalado confortavelmente na casa do Sobrenatural de
Almeida.
Assim como o fatalismo, que é algo irreprimível, posto que
está escrito nas estrelas, segundo asseguram os seus incontáveis adeptos, o
voto fatalista detém algumas de suas prerrogativas. O candidato X vai ser
eleito porque forças além do nosso controle e além da nossa imaginação assim o
decretaram. O problema é que, especificamente nessa eleição, os fatalistas estenderam
espectro do seu fatalismo para além das estrelas para incluir também o texto
das Sagradas Escrituras. Nostradamicamente estão fazendo cálculos baseados em
capítulos e versículos de modo que o resultado aponte para o número do seu
candidato. E não param por aí, retiram da boca dos escritores bíblicos e da
profecia argumentos que supostamente anteviriam suas convicções, e que, por
constarem nos escritos bíblicos, assim seriam inquestionáveis.
Levianamente incorrem em uma série de imprecisões. Em
primeiro lugar que a Bíblia não é um livro cabalístico. Os números nela
contidos são meramente simbólicos e não têm a capacidade de emanar de si
qualquer poder quando invocados. Para ser mais explícito, o número que nela
causa perplexidade, o 666, João do Apocalipse faz questão absoluta de dizer que
número de homem, deixando claro que até mesmo o número da misteriosa besta
transcende essa esfera. Em segundo lugar esta é uma prática que a Bíblia
abomina desde os seus primórdios. Quando o povo de Israel estava para tomar posse
da Terra Prometida uma das ordenanças mais categóricas foi essa: Quando entrares na terra que o SENHOR, teu
Deus, te der, não aprenderás a fazer conforme as abominações daqueles povos. Não
se achará entre ti quem faça passar pelo fogo o seu filho ou a sua filha, nem
adivinhador, nem prognosticador, nem agoureiro, nem feiticeiro; nem encantador,
nem necromante, nem mágico, nem quem consulte os mortos; pois todo aquele
que faz tal coisa é abominação ao Senhor. (Dt 18.9-12 ARA) Ou seja, em quais
circunstâncias a Bíblia que não permite que sequer se nomeie entre o seu povo pessoas
adeptas à prática da adivinhação, autorizaria que se fizesse em seu nome prognósticos
eleitoreiros? Convém lembrar a eleitores e elegíveis que foi justamente por
causa dessas práticas abomináveis que os povos nativos foram expulsos de suas
terras.
Mas ainda não é aí que se encontra o cerne da questão. Se a
Bíblia fosse realmente levada em conta essas pessoas veriam que ela aponta em
uma direção diametralmente oposta a tudo que está se configurando no cenário
nacional. Nada que esteja escrito nas estrelas ou em qualquer outro lugar pode
minimamente ofuscar a mensagem da novidade que a Palavra de Deus nos traz. Jeremias,
no livro das suas lamentações, diz que as misericórdias do Senhor se renovam a
cada manhã, portanto, absolutamente nada em nossa vida está fatalizado ou
determinado, pois Deus não tem uma agenda que consulte para decretar a sequência
dos acontecimentos, mas tem sim uma perspectiva inédita que se descortina a
cada nova situação para nos desafiar.
Que esteja plenamente convicta a igreja que o caminho, para
aqueles que querem se valer das Escrituras para orientar o seu voto, é sempre o
caminho do novo, do nunca visto, do jamais imaginado e do sequer cogitado.
Pois, o que ninguém nunca viu nem ouviu, e
o que jamais alguém pensou que podia acontecer, foi isso o que Deus preparou para
aqueles que o amam. (ICo 2.9) (continua)
Nenhum comentário:
Postar um comentário