O que não é

Mateus, o evangelista, Pompeu Batoni
Não pensem que eu vim trazer paz ao mundo. Não vim trazer a paz, mas a espada. Mateus 10.34

Eu sempre estou dizendo que não sou muito bom em entender o que Deus quer. Falando mais claramente: em conhecer a sua vontade. Porém, eu sou bastante atencioso em investigar as coisas que Deus não quer, e essas eu conheço algumas muito bem.

O versículo supracitado pode exemplificar muito bem o que estou tentando dizer. Eu tenho sérias dúvidas quanto ao contexto em que este versículo deve ser aplicado. Eu penso que estas foram uma das mais controversas palavras de Jesus, não o foi somente para os discípulos que testemunharam o seu ministério terreno, mas também para aqueles a quem chamou de mais bem-aventurados: os que viriam depois destes. Aqueles que não viram e creram.
 
A grande maioria dos ateus com quem convivo tem este texto como principal argumento de divergência entre o seu significado mais imediato e a pregação da não violência proposta por Jesus em vários outros momentos. Não há um deles sequer que não encontre nestas palavras uma chamada explícita para a luta armada em todos os níveis, inclusive o familiar, e se fundamentam no que está escrito em seguida: Mateus 10.35-36 - Eu vim para pôr os filhos contra os pais, as filhas contra as mães e as noras contra as sogras. E assim os piores inimigos de uma pessoa serão os seus próprios parentes.

Logicamente que não posso usar a oração sacerdotal de Jesus como contra-argumento, porque eles diriam os dois textos retratam uma variação do humor do Deus em quem não acreditam existir. E eu não os censuro por isto, porque é exatamente dessa maneira que muitos de nós cristãos o concebemos. Para alguns de nós Deus está em variação constante de humor, e esta variação acompanha bem de perto as suas diferentes atitudes. Se faço o bem Deus está feliz, pelo contrário, quando erro, Deus fica zangado.

Já discorri muito sobre o que não sei. Deixem-me atentar agora para o pouco que sei.

Em primeiro lugar, Jesus está reproduzindo uma profecia de Miqueias 7.6, que diz: Pois hoje em dia os filhos desprezam os pais, as filhas desobedecem às mães, e as noras brigam com as sogras; e os piores inimigos de qualquer pessoa são os próprios parentes. Jesus está antecipando que a sua mensagem causaria uma revolução entre os que nela crerem e os que não a aceitarem. Isso aconteceria até mesmo dentro de uma família bem constituída. Ou seja, ele estava preparando os seus discípulos para uma vida de solidão e abandono. Exatamente o Dietrich Bonhoeffer chamou de “O preço do discipulado”.

Bonhoeffer aprendeu isso a duras penas no campo de concentração nazista onde foi executado. Porém o resultado da sua relutância foi imediatamente reconhecido. Um alto oficial da SS que presenciou a sua execução, a despeito do clima hostil que se instaurou contra o pastor, sobre a sua atitude declarou: Eu nunca vi um homem morrer tão completamente submisso à vontade de Deus.

Baseado em Bonhoeffer podemos concluir que o texto acima vai exigir de nós o enfrentamento de três desafios bem distintos: divisão, decisão e determinação.

Não foi sem motivo que Jesus usou a metáfora do casamento para ilustrar a sua relação com a igreja. Em um casamento que pretende ser sério tem que haver o rompimento dos noivos com vários costumes e atitudes que tinham quando solteiros. Qualquer que pense o contrário estará pondo em sério risco a sua vida conjugal. E é nestes termos que Jesus conclui a exposição do complexo tema: Quem procura os seus próprios interesses nunca terá a vida verdadeira; mas quem esquece a si mesmo, porque é meu seguidor, terá a vida verdadeira.

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