Da culpa à responsabilidade

Desabamento da Torre de Siloé, Tissot
Este é um texto complicado, não é mesmo? Primeiro porque faz alusão a dois episódios completamente desconhecidos do restante da Bíblia. Não encontramos noutro lugar qualquer citação sobre a morte desses galileus, como também não existe outra narrativa sobre a queda da tal torre. Esse texto faz parte de uma série de narrativas exclusivas da investigação, segundo ele próprio, acurada, pois deve ter usado fontes desconhecidas dos outros evangelistas. Se não fosse ele nós nem ficaríamos sabendo desta
chacina, e até onde eu sei, a Bíblia nem menciona que na piscina de Siloé, onde Jesus mandou que o cego de nascença lavasse os olhos, existia uma torre.  

Bom, como eu disse, o texto começa complicado, mas aos poucos ele vai se complicando mais ainda. Inicialmente a conversa girava em torno da chacina de grupo de galileus por ordem de Pilatos, quando praticavam algum tipo de sacrifício expressamente proibido. E a primeira impressão que se tem da cena é que havia pelo menos dois grupos diferentes de pessoas. Um grupo era composto por aquelas pessoas que foram relatar a Jesus o acontecido. Pessoas que estavam tomadas de certa comoção pela morte trágica dos seus compatriotas. Tomadas não somente por compaixão, mas como também por um indisfarçável sentimento de culpa pelo fato de não poderem esboçar qualquer reação contra este atentado, por não poderem fazer absolutamente nada. Era muito arriscado manifestar-se contrário aos desmandos do Império Romano. Por outro lado, havia um segundo grupo, o grupo daqueles a quem Jesus adverte com veemência. O grupo que se empenhava em justificar a chacina. Logicamente que o que os galileus fizeram não foi um sacrifício comum em Israel, os costumeiros sacrifícios judaicos eram permitidos por Roma. Eles deveriam que estar realizando alguma prática muito ilegal, daí a indignação do próprio Pilatos. Para os romanos aquele sacrifício deveria ser algum tipo de heresia, e para os judeus, uma manifestação de idolatria.

Esse grupo, pelo que dá a entender a reação de Jesus, deveria estar imaginando que a morte trágica dos galileus era uma consequência natural do seu erro, assim como um castigo sumário de Deus pelo mal que eles praticavam. Eles deveriam inclusive estrar questionando o sentimento de culpa do outro grupo, e a atitude de procurar justificativas para o injustificável, me corrijam os psicólogos de plantão, é também uma forma de mostrar culpa. O que Lucas relata com rara sensibilidade são dois grupos, que embora se comportando de modos completamente diferente, experimentam o mesmo sentimento. Neste caso dá no mesmo, sentir-se incapaz ou caçar culpados são notórios sintomas de sentimento de culpa.  




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