Tu me farás ver os caminhos da vida; na tua presença há plenitude de alegria, na tua destra, delícias perpetuamente. Salmo 16
Gore Vidal, no seu romance Messias, escrito em 1947, logo após as explosões das primeiras bombas atômicas no Japão, que terminaram com a Segunda Guerra Mundial e marcaram o início da chamada Guerra Fria, fazia uma análise negativa daqueles anos de tensão entre o bloco americano e o soviético, com a aguda investigação que esse escritor sempre se mostra capaz. Mas o enredo do seu romance detecta também um desses indigestos pastores eletrônicos que prometem verdadeiros milagres, à semelhança do que acontece com certos pastores brasileiros que transformam a vida religiosa em um balcão de vergonhosos negócios e em uma pregação incompetente e mentirosa.
Davi parece preocupado, Np presente salmo, com essa gente que, já em seu tempo, trocava o Senhor por outros deuses. E o poeta diz textualmente: os meus lábios não pronunciarão os seus nomes... Bendigo ao Senhor que me aconselha; pois até durante a noite o meu coração me ensina... Pois não deixará a minha alma na morte nem permitirá que o teu Santo veja corrupção – pensamento que a Igreja vê como referência profética a Jesus. O salmista conclui seu poema dizendo: tu me farás ver os caminhos da vida.
Com base nesse salmo, no Saltério e na Bíblia como um todo, é possível dizer que, para participar do caminho vivo e verdadeiro que nos coloca face a face com Deus, é preciso, depois da graça divina, que tenhamos coragem de dar alguns passos. Até porque o amor divino não exclui a nossa participação, como resposta.
Primeiro a humildade do despojamento. Como Sócrates, que dizia: sou sábio porque nada sei. Acima de tudo e de todos, à semelhança de Jesus que, no entender de Paulo, na carta aos filipenses, se esvaziava da sua glória e se tornava servo de todos os homens, faria bem para nossa vida um olhar para Albert Schweitzer, um gênio entre os leprosos de Lambarene, na África. E o aprendizado definitivo com o pobrezinho de Assis. Tudo tão diferente do cínico e engomado mercador descrito por Gore Vidal.
Mas é indispensável também dizer um não ao moralismo e a hipocrisia, se quisermos trilhar o caminho vivo que Davi menciona no seu salmo. Fazer como Cristo, que não tinha escrúpulos de comer com pessoas desqualificadas, e tratar por senhoras as prostitutas – aliás, o mesmo tratamento que dispensava à sua mãe. Uma releitura da parábola conhecida como O Bom Samaritano certamente nos ajuda a atingir o cerne do problema, em direção visceralmente oposta à proposta pelos pastores eletrônicos da vida.
Mas, para participar do caminho vivo que nos fala o salmista, é sobretudo essencial uma relação direta e existencial com Deus, coisa que jamais parece acontecer com os pastores eletrônicos, suas gracinhas, as atitudes lesivas e a superficialidade do que dizem, em meio a um sorriso estúpido e alvar.
Ao mergulhar no tema proposto pelo salmo de Davi, a mim é impossível não relacioná-lo à afirmação de Jesus no Evangelho que recebo como um verdadeiro desafio: eu sou o caminho, a verdade e a vida, ninguém vem ao Pai senão por mim.
Por que não aceitá-lo como nosso?
Esta pergunta é também para você.
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