Um conhecimento acima da razão

Não ensinará jamais cada um ao seu próximo, nem cada um ao seu irmão, dizendo: Conhece ao Senhor, porque todos me conhecerão, desde o menor até ao maior deles, diz o Senhor. Jeremias 31.34

Já tivemos oportunidade de meditarmos sobre o conhecimento de Deus algumas vezes aqui neste blog, particularmente em http://amosboiadeiro.blogspot.com.br/2012/03/conhecimento-que-falta-faz.html. Contudo, na ocasião não nos demos conta de que ele é o hodômetro que mede o quanto estamos próximos do Reino de Deus. A despeito de muitos afirmarem que os sinais do fim dos tempos estão mais visíveis hoje do que em qualquer outro período da História, o que indistintamente todas as gerações a partir da ressurreição de Cristo o têm feito, é o conhecimento de Deus que se faz uma necessidade reconhecida e pregada por todos os profetas veterotestamentários. Há um consenso no contexto bíblico que evoca como fator primordial para a consumação do Reino a obsolescência do ensino, porque, como diz o nosso texto, todos conheceram a Deus em igualdade de condições.

Tenho pensando nestas palavras e tentado traduzi-las para a condição humana, no entanto, não consegui encontrar um paralelo ainda que utópico para esta realidade. Que tipo de conhecimento seria suficientemente pleno de modo a alcançar e ser absorvido por crianças e adultos indistintamente? Que linguagem este conhecimento usaria para transpor barreiras etárias, culturais, regionais, econômicas e religiosas?

Alguns acréscimos muito bem vindos à bênção apostólica, registrada em II Co 13,13 podem contribuir bastante e nos dar um indício superficial que serviria como uma resposta temporária a estas questões. Um deles é aquele que diz que o amor de Deus excede a compreensão humana. Se o amor de Deus excede à nossa compreensão, de pronto ficamos sabendo que jamais vamos encontrar paralelo algum. Mesmo que alguns adjetivos ou atributos sejam conferidos a este amor no sentido claro de torná-lo acessível à compreensão pelo esforço da mente humana, como chamá-lo de incondicional, incomensurável, inefável ou indescritível, estes não passam de tentativas frustradas que sequer arranham o seu real significado. 

Devemos concluir que o conhecimento de Deus não passa por definições que o intelecto humano pode considerar, mas sim pela aceitação irrestrita deste amor, um reconhecimento de indistintamente todos, velhos, crianças, cristão e não cristãos são alcançados por ele, e um caminhar humilde segundo a vontade de Deus como as únicas formas de nos apropriarmos do conhecimento. O conhecimento de Deus não é para ser apreendido e sim para ser experimentado e compartilhado.

Outro acréscimo igualmente bem vindo invoca o amor de Deus para que guarde os corações no conhecimento da verdade. Quem ouve isso pode muito bem concluir que o conhecimento da verdade seria um sério candidato a postular o título de arauto do conhecimento pleno, mas não é bem assim. A verdade para nós é a declaração fidedigna da realidade dos fatos, a exposição absolutamente fiel do acontecimento e circunstâncias. Pode ser para nós, mas para a Bíblia não é isso não. A verdade da Bíblia pouco tem a ver com a realidade, aliás, ela diz exatamente o contrário, ela diz que o que estamos vendo e vivendo não é real, e sim uma imagem de uma realidade infinitamente maior que só pode ser vista de longe e com olhos da fé.

Outro aspecto que nega a nossa concepção de verdade, curiosamente é o seu oposto, a mentira. Tomemos como exemplo a atitude de Raabe na conquista de Jericó. Ela faltou com a verdade quando perguntada pelos espiões de Josué, e isso lhe foi imputado como prova de fé. Fico imaginando se ela fosse se confessar com um pastor ou um padre de hoje. Seria seriamente acusada e estaria em pecado sob a ameaça de arrependimento irrestrito. Eu também pensaria assim se não tivesse sido vítima do governo militar. Fui denunciado ao DOPS pelo reitor da faculdade, que era meu pastor na ocasião, e interrogado pela pessoa que cantava ao meu lado no coro da igreja. 

Naqueles anos de chumbo da ditadura brasileira, cristãos fiéis acobertaram perseguidos pela polícia política recebendo-os em suas casas e mentindo sobre o seu paradeiro. Um destes heróis da fé me disse que havia ficado em uma situação terrível e já não participava da ceia, pois na época ocultava em sua casa um pastor que estava sendo perseguido, e que havia sido substituído por outro em quem não podia confiar. Este foi, sem dúvidas, um ato de fé extremamente louvável, e é, da mesma forma, um forte argumento que nos esclarece que a verdade na Bíblia pouco tem a ver com a realidade dos fatos e muito a ver com a vontade de Deus.

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