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Isaías no templo, Lisbeth Zwerger |
Leia Isaías 6
O perigo iminente se transformou em perdão incondicional: a tua iniquidade foi tirada, e perdoado o eu
pecado. A tensa apreensão se tornou um desafio: a quem enviarei, e quem há de ir por nós? Disse eu: eis-me aqui. O grito
de pavor virou resposta: envia-me a mim.
A partir de então, Isaías era um profeta? Ainda não. Faltava-lhe ainda conhecer
o conteúdo da profecia.
Neste estágio pós-traumático em que Isaías se encontrava favorece
muito o imediatismo de uma resposta positiva a um chamado ainda não tão
definido. A prontidão da resposta de Isaías é diametralmente oposta à reação de
outros profetas bíblicos, mas muito parecida com a daqueles que se proclamam profetas
atualmente. Observem que os profetas de hoje também fundamentam o seu chamado
profético em uma experiência extrassensorial, ainda que não tenham digerido bem
o comprometimento que aquele chamado exige. A regra é muito simples: enquanto
outros grandes profetas bíblicos tentaram de todas as maneiras recusar o seu
chamado e negarem teremptoriamente a sua vocação profética, os profetas atuais
fazem absoluta questão de serem assim chamados, e até se sentem orgulhosos
disso.
Vejam o que disse Moisés: Senhor, eu sou velho e gago. Jeremias: Senhor, eu não passo de uma criança. Amós se escondeu atrás do
gado. Ezequiel enlouqueceu. Oséias foi obrigado a receber de volta a esposa que
se prostituíra. Sem falar dos profetas anônimos que a maldade humana calou
antes que seus nomes fossem conhecidos.
Mas a euforia de Isaías iria durar muito pouco. Como prova do
que foi dito anteriormente, que uma experiência com Deus nunca é experiência definitiva
de nossas vidas, por mais sobrenatural que possa parecer, o “eis-me aqui” de
Isaías logo irá se tornar um “até quando?”.
Isaías se torna um autêntico profeta quando começa a
questionar a missão profética para a qual é chamado a executar. Exatamente como
acontece com o perdão, a missão profética pode a princípio parecer doce, mas no
fundo é extremamente amarga: Torna
insensível o coração deste povo, endurece-lhe os ouvidos e fecha-lhe os olhos,
para que não venha ele a ver com os olhos, a ouvir com os ouvidos e a entender
com o coração, e se converta, e seja salvo.
Que contradição mais doida é essa? Ter que falar para não
ser ouvido. Ter que pregar para não ser entendido. Ter que convencer sem poder converter.
Para que fique registrado tão somente? Apenas para dizer mais tarde: eu não
disse? Até quando, Senhor? Ele respondeu:
Até que sejam desoladas as cidades e fiquem sem habitantes, as casas fiquem sem
moradores, e a terra seja de todo assolada, e o SENHOR afaste dela os homens, e
no meio da terra seja grande o desamparo.
Isaías assume a condição de profeta quando toma conhecimento
de que no seu chamado não há nada que assegure que ele ficará livre dos
terrores que ele mesmo proclama. A sua cidade também ficará desolada, sua casa
ficará também vazia e seus parentes próximos serão assolados, e ele mesmo
ficará desamparado. O profeta bíblico não se parece em nada com um franco
atirador, que se esconde nas trevas e alveja os seus inimigos, muito menos como
alguém que senta em uma metralhadora giratória e atira para todos os lados. Mal
comparando, ele está mais para um homem-bomba, que paga com a própria vida o
preço da sua profecia.
Dizia o grande pregador do evangelho, bispo Almir dos Santos:
sermão não é para ninguém gostar, e sim para converter. O texto de Isaías 6
mostra com detalhes como deve ser a sequência primordial de um culto cristão: o
encontro com Deus, o reconhecimento de si, o sentimento de perda irreparável, o
perdão incondicional, o desfio e o compreensão da mensagem. Tudo a mais é
floreio, tudo a mais é bijuteria. Tudo a mais serve mais a nós mesmos do que o
propósito do culto.
O que para você faz o culto cristão ser diferente de outras
celebrações litúrgicas e de outros cultos?
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