O rei da floresta

Os 300 de Gedeão, Gustav Doré
Então todos os homens de Siquém e de Bete-Milo se reuniram na árvore sagrada de Siquém e ali fizeram de Abimeleque o seu rei. Quando Jotão soube disso, subiu até o alto do monte Gerizim e gritou para eles:
— Homens de Siquém, me escutem, e Deus escutará vocês!
Aí Jotão disse:
— Uma vez as árvores resolveram procurar um rei para elas. Então disseram à oliveira:
— “Seja o nosso rei.” E a oliveira respondeu:
— “Para governar vocês, eu teria de parar de dar o meu azeite, usado para honrar os deuses e os seres humanos.” Aí as árvores pediram à figueira:
­— “Venha ser o nosso rei.” Mas a figueira respondeu:
— “Para governar vocês, eu teria de parar de dar os meus figos tão doces.” Então as árvores disseram à parreira:
— “Venha ser o nosso rei.” Mas a parreira respondeu:
— “Para governar vocês, eu teria de parar de dar o meu vinho, que alegra os deuses e os seres humanos.” Aí todas as árvores pediram ao espinheiro:
— “Venha ser o nosso rei.” E o espinheiro respondeu:
— “Se vocês querem mesmo me fazer o seu rei, venham e fiquem debaixo da minha sombra. Se vocês não fizerem isso, sairá fogo do espinheiro e queimará os cedros do Líbano.” Juizes 9.6-15

Esta é uma parábola muito interessante, embora não seja de origem judaica, pois a simples utilização das palavras Deus e homem, lado a lado, já seria considerada, nesta fé, uma grande blasfêmia. Contudo, a sua aplicação na prática é de uma genialidade fantástica.

Gedeão, o grande juiz de Israel, havia morrido. O temor que a nação viesse a ser invadida novamente pelos povos vizinhos era latente. Seu filho Abimalec, após matar setenta de seus irmãos homens, tentou se fazer rei em Israel. Um dos irmãos que havia escapado era um meio irmão cujo nome parece querer significar Deus é perfeito, Joatão, rapidamente tentou impedir esta que seria uma inominável tragédia. Joatão, aproveitando-se de uma reunião marcada junto ao carvalho de Siquém, árvore considerada sagrada por todos aqueles povos, inclusive pelos judeus, aos berros propõe a parábola das árvores que queriam um rei. E não é que ele consegue mostrar nessas breves palavras todos os aspectos negativos dessa escolha?

A oliveira, a figueira e a parreira são plantas básicas na economia daqueles países, e, de uma forma bastante evidente, contestam a soberania dos cedros Líbano, que produz madeira somente uma vez, posto que necessita ser cortado, e que também se destacam das árvores daninhas e perigosas, como os espinheiros.

O radical KBD usado para qualificar o fruto da oliveira é a origem de palavras traduzidas por engordar, enriquecer e sustentar. Os figos são a base da alimentação e do comércio daquela região, um elemento vital que não pode sofrer alterações sem que o povo venha a se ressentir. E a uva é o símbolo da alegria da liberdade que pode ser perdida, caso aquele proponente seja ungido rei.

Na parábola, Abimalec é o espinheiro, que faz sangrar todos os que dele se aproximam, e que também é a causa de incêndios florestais, pois alguns deles, sob o sol escaldante, produzem combustão espontânea. 

A parábola é demais significativa para os nossos dias. Ela narra com detalhes precisos o conluio dos nobres do cedro de Siquém, que não contribuem com absolutamente nada para a economia da região, mas se reúnem a revelia do povo para escolher um governante sinistro, que, por sua vez, nada produz, apenas dor e prejuízo, para ser a ruína anunciada de todos os que trabalham e movimentam a economia que gera a vida e o bem estar das nações. Mais detalhe sórdido: o espinheiro, quando se vê contestado na sua autoridade, não faz outra coisa, a não ser ameaçar punir com extremo rigor, todos aqueles que a ele se opõem.

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