Luz e sombra

Jesus e as crianças, jesusandkidz.com
Por aquele tempo, exclamou Jesus: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim foi do teu agrado. Mt 11.25s

Uma das investidas mais iradas que os ateus fazem contra o pensamento cristão recai sobre o famoso argumento de apologética levantado pelo filósofo, físico e matemático francês do século XVII Blaise Pascal. Argumento esse que ficou conhecido como a Aposta de Pascal. Em resumo ele diz o seguinte: Não se pode provar que Deus existe. Mas se Deus existe, o crente ganha tudo (céu) e o descrente perde tudo (inferno). Se Deus não existe, o crente nada perde e o descrente nada ganha. Portanto, há tudo a ganhar e nada a perder em acreditar em Deus. A despeito de reconhecer a genialidade de Pascal, não faço coro com ele neste pensamento, simplesmente porque penso que o crer não me pertence, eu, sim, é que pertenço a ele. Minha preocupação maior é se Deus, após tantas quedas, omissões e iniquidades, ainda acredita em mim.

Todavia, aproveitando-me de um viés deixado por essa lógica de Pascal, permito-me fazer a seguinte pergunta: Por que as pessoas humildes creem com mais facilidade em Deus do que as mais abastadas? Estaria apenas na falta do poder aquisitivo a inclinação do homem para a fé? Quem não poderia dizer nesta hora que uma melhor condição econômica tem o poder de elevar a mente humana a um patamar de onde ela enxergue mais motivos para não crer tão facilmente como fazem os humildes? Ou seja, novamente insistimos em confinar as questões da fé unicamente na vontade e na razão humana. Nós é que decidimos se vamos crer ou não crer, e ponto final.

Não é bem isso que a Bíblia diz. Jesus, momentos antes do diálogo que travou com um dos baluartes da cultura em Israel, diálogo esse que o levou a contar a parábola do Bom Samaritano, faz a oração que é o nosso versículo base: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos. Ele estava querendo dizer que, mais do que uma conquista da qual a mente humana possa se orgulhar, a fé é uma questão de estar na luz da revelação ou estar numa sombra bem próximo a essa luz. Ao contrário do que pensam os ateus acerca dos cristãos viverem permanentemente na escuridão da fé, Jesus diz que os que não creem vivem em uma espécie de penumbra, de onde, apesar de toda a sua cultura, não conseguem enxergar a revelação de Deus.

Mas aqui se levanta uma outra questão: Por que Deus ora se revela e ora se esconde? Pelo menos é o que concluímos a partir da leitura do Primeiro Testamento, segundo a qual o intérprete da lei, que coloca Jesus à prova, era perito. Ele entendia que Deus era um ser que necessitava ser procurado, perseguido, até mesmo, como fez Jacó, enfrentado em uma luta, para se obter dele uma breve revelação. Mas Jesus veio nos dizer justamente o oposto. Veio anunciar um Deus que está à espreita, não para castigar, mas para se revelar por inteiro ao menor passo que o pecador der em sua direção. 

Jesus diz também que Deus escolheu, pela sua própria vontade, revelar-se por meio do evangelho. Esta é a boa notícia que só está disponível aos que realmente são pequeninos, humildes e impotentes, porque somente na glória de Deus eles podem ver novamente a idoneidade que lhes faz tanta falta. É lá que ainda podem ter a esperança de que seus desejos sejam realizados. Onde podem olhar novamente para os seus rostos no espelho e sentirem que por trás da imagem luz e sombra, ainda existe uma alma. Somente aqueles que nada mais tem a perder, e aqui Pascal é questionado, creriam na aposta de um Deus que, no lugar de um poderoso guerreiro, envia uma criança indefesa para realizar o seu propósito maior. 

Bem melhor e mais propício ao evangelho do que se engalfinhar com os que não creem na tentativa de provar que Deus existe, é podermos mostrar por meio de atos concretos de amor, a nossa gratidão por termos sido alcançados pela luz da revelação de Deus. Isso é suficiente para que eles tenham, ainda que envoltos pela sombra, a luz de um Deus os ama, a despeito de crerem nele ou não. 

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